Combate à criminalidade 2.0

A revolução da Web 2.0, fenômeno que permite a qualquer internauta participar e colaborar com a elaboração de conteúdo on-line, agora está a serviço do combate à criminalidade. A página WikiCrimes permite que os usuários publiquem informações sobre assaltos, furtos ou agressões que tenham sofrido ou presenciado ou do qual tenham tomado conhecimento. A idéia é mapear os locais de maiores índices de violência em cidades de todo o Brasil com dados produzidos pelos leitores.

Tela do WikiCrimes com os registros de roubos, furtos e agressões em Fortaleza. Os usuários podem publicar vídeos que confirmem a ocorrência de crimes.

A iniciativa foi criada por Vasco Furtado, professor da Faculdade de Informática na Universidade de Fortaleza (Unifor) e pesquisador na área de tecnologia aplicada em segurança pública. A idéia surgiu há cerca de um ano, enquanto ele fazia pós-doutorado na Universidade de Stanford (EUA), onde a Web 2.0 tem sido amplamente debatida e estudada.

O objetivo do WikiCrimes é democratizar o acesso às informações sobre criminalidade, que em geral encontram-se monopolizadas nas mãos das instituições oficiais do governo. Além disso, a iniciativa busca superar o problema da subnotificação – casos de assaltos ou furtos que não são registrados na polícia. Estimativas dão conta que na cidade de São Paulo 60% dos crimes não chegam a ser registrados pelas vítimas.

“É preciso disponibilizar essas informações de maneira mais transparente. Ao sofrerem um assalto em uma determinada rua, as pessoas buscam alertar os mais próximos para evitarem passar pela região. Com o WikiCrimes, esse alerta se torna mais abrangente” – conta Furtado à CH On-line.

Registrar um crime é muito simples. Depois de se cadastrar no sistema, o usuário pode escolher o tipo de ocorrência que deseja registrar e o local onde ela se deu. O usuário deve dar detalhes sobre a data, a hora e o tipo de local em que o crime foi cometido, além de informar se ele foi notificado à polícia ou não. Uma descrição textual da ocorrência também pode ser feita.

Embora as páginas wiki, que podem ser editadas pelos próprios usuários, sofram críticas por serem suscetíveis a ataques de vandalismo, o WikiCrimes conta com formas para garantir a credibilidade do conteúdo postado. Para registrar um crime, o usuário pode informar o endereço eletrônico de outras pessoas que possam confirmar a ocorrência. Quanto mais confirmações um crime tiver, maior a credibilidade do relato. Além disso, outras pessoas podem acrescentar informações aos delitos já registrados. Dessa forma o relato do crime é feito também de maneira colaborativa.

É possível que os usuários publiquem links com notícias de jornais ou vídeos que comprovem o ocorrido. Além disso, foi desenvolvido um algoritmo para se calcular a confiabilidade daquilo que é postado, comum em páginas de conteúdo colaborativo. “Fazemos pesquisas na internet para saber se as informações publicadas podem ser confiáveis. Dessa forma podemos saber se uma determinada área produz informações mais confiáveis do que outras.”

Projeto de cidadania
O WikiCrimes também recebe dados de usuários de outros países. Já foram notificados cerca de 200 crimes em diversas regiões do Brasil. Contudo, segundo o criador da iniciativa, é necessária uma notificação maior e mais constante por parte dos usuários. Na segunda quinzena de janeiro, será lançada sua versão em inglês; versões em francês e espanhol também estão em desenvolvimento.

Segundo Furtado, a realidade de países da América Latina é semelhante à do Brasil, mas o processo de interação dos internautas ainda está em construção gradual. “Nossa sociedade tem uma cultura pouco participativa”, avalia. “Em geral as pessoas querem consultar a página, mas postam pouco. É preciso uma movimentação maior da sociedade.”

Furtado conta que tem buscado ampliar as fontes de informação do WikiCrimes. Segundo o professor, está sendo fechada uma parceria com o Ministério Público para a publicação de dados oficiais. Estão em andamento também negociações com secretarias de segurança de todo o país e com o Ministério da Justiça. Além disso, está em desenvolvimento um projeto com comunidades de bairros carentes para a coleta de informações e, dessa forma, a democratização da origem do conteúdo. “Trata-se de um trabalho com um viés tecnológico e cientifico, mas que prioriza acima de tudo a cidadania”, declara Furtado.

Igor Waltz
Ciência Hoje On-line
23/01/2008