Corra que os morcegos vêm aí

Uma espécie de morcegos vampiros (que se alimentam de sangue) revelou uma habilidade até então nunca observada em animais desse tipo: eles são rápidos ao se locomoverem no chão. Um estudo recente da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, revelou que esses mamíferos voadores também são capazes de correr com os quatro membros, diferentemente dos outros morcegos que, quando não estão no ar, andam pelo solo de um jeito desengonçado.

O morcego vampiro Desmodus rotundus é o único capaz de se deslocar por terra com rapidez e agilidade (foto: Universidade de Cornell)

O surpreendente galope do Desmodus rotundus foi registrado com uma câmera de vídeo por Daniel K. Riskin e John W. Hermanson e descrito na revista Nature de 17 de março. Em laboratório, eles testaram cinco machos adultos dessa espécie, originária das Américas Central e do Sul. O experimento consistiu em colocá-los em uma espécie de esteira: à medida que sua velocidade aumentava gradativamente, os animais começaram a correr.

 
Os morcegos da espécie D. rotundus adquirem grande parte do impulso dos membros anteriores ‐ que são suas asas, dotadas de grande força. Quando correm, eles se assemelham mais a pequenos gorilas do que a mamíferos de seu porte, como ratos. Eles chegam a se deslocar em uma velocidade de até quatro quilômetros por hora. Existe uma outra espécie de morcegos hematófagos ou vampiros ‐ Diaemus younqi ‐ que, apesar de caminhar bastante rapidamente, não é capaz de correr.
 

Clique na imagem para assistir a um vídeo que mostra um morcego vampiro correndo em laboratório (arquivo .mov, 569 KB). Crédito: D. K. Riskin / J. W. Hermanson

Os pesquisadores acreditam que a habilidade de correr evoluiu de forma independente nos morcegos hematófagos, a fim de facilitar a busca por alimento. É provável que a maioria dos morcegos tenha perdido essa capacidade à medida que seus membros dianteiros tornaram-se mais especializados para voar. No entanto, a espécie D. rotundus pode ter readquirido esta característica independentemente, em um passado distante, quando tinha que caçar o sangue de animais mais velozes perto do solo.

 
Os morcegos hematófagos se alimentam do sangue de animais de grande porte como bois, cavalos e porcos e não chegam a correr. Pelo chão, eles se aproximam sorrateiramente de sua presa adormecida e fazem pequenas incisões em sua pele, geralmente na região do calcanhar. Com a introdução de vastas pastagens nos hábitats das Américas Central e do Sul, eles não precisam se apressar para conseguir extrair o equivalente a uma colher de sopa de sangue para sua sobrevivência. “Mesmo assim, correr pode ajudá-los a evitar que sejam pisoteados”, sugere Riskin, “já que levam bastante tempo se alimentando.”
 
O próximo passo da pesquisa consistirá em comparar a locomoção terrestre do morcego vampiro com a do morcego de cauda curta da Nova Zelândia ( Mystacina tuberculata ). Este último passa uma quantidade de tempo significativa no solo em busca de insetos. Riskin explica que o hematófago tem que ter desenvoltura na terra, diante do perigo que é alimentar-se nas patas de um animal que tem o peso 14 mil vezes maior que o seu. Em contrapartida, os insetívoros neozelandeses ‐ que não correm ‐ não têm predadores na terra e caminham mais que os outros morcegos.

Lia Brum
Ciência Hoje On-line
22/03/05