Direto ao ponto

Partículas com cerca de quatro bilionésimos de metro conduzem uma substância antitumoral até células com leucemia, mantendo intactas as células saudáveis. É assim que funciona um sistema desenvolvido por químicos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que tem como principais elementos nanopartículas de ouro e um pigmento produzido por uma bactéria amazônica. Sua ação seletiva foi verificada com experimentos in vitro , mas ainda são necessários muitos testes para que o invento venha a ser aproveitado na indústria farmacêutica.

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Nanopartículas de ouro com três a quatro nanômetros, aumentadas em 50 mil vezes por microscopia eletrônica de transmissão (imagem: LQES – Unicamp)

O princípio ativo deste sistema é um pigmento chamado violaceína, produzido pela bactéria Chromobacterium violaceum , de conhecido potencial farmacológico. Embora essa substância provoque a morte das células com câncer, não surte efeito algum quando aplicada sozinha, pois é insolúvel em água. Uma solução para esse problema foi encontrada por pesquisadores do Laboratório de Química Biológica da Unicamp, coordenado pelo professor Nelson Duran. A equipe resolveu adicionar o pigmento à ciclodextrina – um açúcar cuja molécula tem a forma de um recipiente, capaz de armazenar diversas substâncias.

O grupo de Duran constatou que a solução de violaceína com ciclodextrina matava células leucêmicas. “Porém, sua ação não era seletiva, e matava também as células normais”, conta o químico. Para contornar esse obstáculo, seria preciso obter um meio de levar as moléculas do fármaco diretamente às células tumorais. Entrou em cena então uma equipe do Laboratório de Química do Estado Sólido da Unicamp, que vinha sintetizando nanopartículas de diversos materiais e com diversos fins – entre eles o transporte de medicamentos.

A estrutura da ciclodextrina foi crucial para viabilizar a associação da violaceína às nanopartículas de ouro. Enquanto uma das extremidades da molécula desse açúcar se combina com o pigmento, a outra contém um grupamento de átomos de enxofre e hidrogênio que apresenta uma grande afinidade com o ouro que compõe as partículas.

O sistema desenvolvido na Unicamp é capaz não apenas de resolver o problema da insolubilidade da violaceína, como também de conferir ao pigmento uma seletividade que a maioria dos quimioterápicos usados atualmente não tem. Entretanto, ainda não se sabe por que as nanopartículas são atraídas para as células com leucemia. “Isto é o que estamos estudando neste momento”, diz Oswaldo Alves, coordenador do Laboratório de Química do Estado Sólido.

O sistema já foi patenteado e os cientistas esperam fazer testes com animais no início de 2006. Futuramente, as equipes também pretendem experimentá-lo com outros tipos de células cancerosas e com outras substâncias ativas.

Lia Brum
Ciência Hoje On-line
01/09/05