E assim fez-se a luz

Foram encontradas em Israel pistas valiosas para situar no tempo uma etapa crucial da evolução do homem: o controle do fogo. A época exata dessa importante conquista dos humanos na luta pela sobrevivência ainda é motivo de debate entre os cientistas. Para colocar mais lenha nessa fogueira, uma equipe de arqueólogos israelenses identificou vestígios de controle de fogo por hominídeos de mais de 790 mil anos, meio milhão de anos antes do marco reconhecido pelos cientistas como o mais preciso.

Semente queimada encontrada em Israel, com casca e embrião
facilmente identificáveis (fotos cedidas por Naama Goren-Inbar)

Pesquisadores da Universidade Hebraica de Jerusalém encontraram no sítio arqueológico de Gesher Benot Ya’aqov (GBY), em Israel, sementes, fragmentos de madeira e microartefatos de sílex queimados. A forma como esses objetos estavam dispostos — em pequenos conjuntos próximos uns dos outros — indica que podem ter sido usados em fogueiras. A descoberta do material foi relatada na edição de 30 de abril da revista Science .

Essa evidência de domínio do fogo — a mais antiga já obtida fora da África — foi obtida em escavações conduzidas entre 1989 e 1997. Ela pode ajudar a esclarecer como se deu a colonização da Europa, que teve início há aproximadamente 800 mil anos. “O sítio está localizado no caminho de saída da África, o que sugere que os hominídeos tinham o conhecimento do controle do fogo durante a sua jornada para a Europa”, disse à CH On-line a arqueóloga Nira Alperson, uma das sete autoras do artigo.

 

As escavações no sítio arqueológico de Gesher Benot Ya’aqov foram feitas em sete temporadas entre os anos de 1989 e 1997

Antes da descoberta israelense, as mais antigas fogueiras comprovadamente construídas por hominídeos não tinham mais de 250 mil anos e foram encontradas em cavernas bem preservadas. Na África, ossos queimados com mais de um milhão e meio de anos foram achados em 1988, o que seriam evidências de uso de fogo por hominídeos bem mais antigas que as de Israel.

 

No entanto, a validade da descoberta africana ainda é discutida, pois o fogo poderia ter sido causado por incêndios naturais. “Acreditamos ter provas mais fortes do que as conhecidas na África, pois apresentamos dois tipos de evidências: itens botânicos e microartefatos de sílex queimados”, disse Alperson. O sítio arqueológico de GBY se localiza numa região inundada, o que possibilitou a conservação de diversos materiais orgânicos.

A forma como a madeira, as sementes e o sílex (rocha capaz de produzir centelhas quando atritado em peças de metal) foram encontrados em GBY descarta qualquer possibilidade de terem sido causados por incêndios naturais. Certamente foram feitos por hominídeos, mas os cientistas ainda não sabem de que espécie: Homo erectus , Homo ergaster ou até um arcaico Homo sapiens .

A conquista do fogo foi uma importante vitória no caminho evolucionário do homem. “Uma vez ‘domesticado’, o fogo forneceu proteção contra predadores, calor e luz”, disse Alperson. “Além disso, uma nova gama de alimentos se tornou acessível para os humanos, pois eles começaram a cozinhar.”

Liza Albuquerque
Ciência Hoje On-line
29/04/04