Com o aumento contínuo da temperatura, o clima da região amazônica se tornará mais seco e a floresta vai adquirir características próprias da savana.
A segunda parte do relatório do IPCC, elaborada por 2.500 cientistas de todo o mundo, trata da adaptação e da vulnerabilidade dos países ao aumento de temperatura global – que, segundo o Painel, pode chegar a 4 °C até o fim deste século. No Brasil, entre os impactos previstos, está a savanização da floresta amazônica. “Com o aumento do calor, os ciclos de evaporação se tornam mais constantes, sem tempo suficiente para cultivar a vegetação tropical”, explica o biólogo Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Segundo ele, o cenário mais pessimista prevê ondas de calor (como a que matou 35 mil pessoas em 2003 na Europa) a cada dois anos. “As primeiras vítimas serão as árvores de grande porte”, declara.
Mudanças afetarão maravilhas da natureza
Alguns dos lugares mais bonitos do mundo – além de espécies da fauna – podem sucumbir ao aquecimento global. Um relatório divulgado no dia 5 pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF, na sigla em inglês) listou as dez maravilhas naturais que mais seriam afetadas pela escassez de água e a elevação da temperatura. São elas:
– floresta amazônica;
– barreiras de corais da Austrália;
– salmões selvagens de Bering, no Ártico;
– deserto de Chihuahua, entre o México e os Estados Unidos;
– tartarugas Hawksbill, que vivem na América Latina e no Caribe;
– floresta Valdivia, no Chile e na Argentina;
– tigres de Sundarbans, que vivem na Índia;
– rio Yangtze, na China;
– geleiras do Himalaia; e
– florestas costeiras do leste da África.
Com esse quadro, a ocorrência de doenças como malária e leishmaniose pode alcançar proporções ainda maiores, e não só no Brasil. “Acredita-se que o mosquito transmissor da malária consiga chegar mesmo em regiões altas da África, o que não ocorre hoje”, acrescenta. Confalonieri também ressalta que o aumento na temperatura, combinado à maior concentração de gases poluentes, vai aumentar a incidência de doenças cardio-respiratórias na população.
Injustiça ambiental
Quem mais vai perder com os impactos do aquecimento global serão os países mais pobres, justamente os que menos contribuíram com emissões de carbono – o continente africano, por exemplo, tem uma ‘parcela de culpa’ que não chega a 2% e será uma das regiões mais afetadas. Por se localizarem em áreas de clima mais quente, a América do Sul e a África sofrerão com a transformação não só da temperatura e da paisagem, mas também da economia local. A agricultura será o primeiro setor prejudicado, explica Antônio Magalhães, do Banco Mundial. Apesar da injustiça ambiental, ele diz que os países mais pobres não podem “ficar esperando a ajuda dos ricos” e devem tomar suas próprias iniciativas.
O aquecimento global vai reduzir a quantidade e a qualidade da água potável do planeta, o que levará ao aumento das doenças diarréicas.
Uma voz solitária
Apesar das evidências, há quem discorde das previsões do relatório – que tem 80% de confiabilidade. Para o geógrafo Aziz Ab’Saber, a elevação da temperatura provocará maior evaporação do oceano Atlântico, o que aumentará a umidade na floresta amazônica. Segundo ele, esse fenômeno faria com que a vegetação crescesse – e não diminuísse. Mesmo solitária, a afirmação do geógrafo não é absurda. Os pesquisadores concordam que, em um primeiro momento, o aumento das chuvas pode estimular o crescimento da vegetação. Mas, se a temperatura continuar subindo, o clima da região se tornará mais seco e a floresta vai adquirir características próprias da savana.
Embora as conclusões tenham alto grau de confiabilidade, esse cenário pode ser menos assustador do que o previsto. Para isso, a redução do desmatamento e a adoção de medidas de adaptação e de mitigação das emissões de gases do efeito estufa são fundamentais. Mas a hora de começar é agora.
Fernanda Alves
Ciência Hoje On-line
11/04/2007