Jurássico e tecnológico

Em cena de perseguição do filme Jurassic Park, de 1993, um Velociraptor salta sobre um balcão e se equilibra com a ajuda da cauda. Do outro lado da tela, quase 20 anos depois, pesquisadores dos Estados Unidos estudam, em lagartos, como a presença da cauda pode interferir na estabilidade de seus saltos. Conclusão: o ‘segredo’ está no modo como os animais a movimentam no ar.

Publicada este mês na Nature, a pesquisa corrobora uma hipótese levantada em 1969 de que os dinossauros do grupo mostrado no filme usavam a cauda para se equilibrar enquanto corriam e se esquivavam de predadores. Mas o que mais entusiasmou os biólogos e matemáticos envolvidos no estudo foi a possibilidade de aliar a descoberta à tecnologia:

“O uso da cauda como um estabilizador pode servir de base para uma geração de robôs mais ágil e capaz de lidar com tombos inevitáveis”

“O uso da cauda como um estabilizador pode servir de base para uma geração de robôs mais ágil e capaz de lidar com tombos inevitáveis quando, por exemplo, estão explorando escombros em operações de busca e salvamento”, prevê o coordenador do estudo, Robert Full, do Departamento de Biologia Integrada da Universidade da Califórnia, Berkeley, nos Estados Unidos.

Ângulo preciso

Ao observar que o lagarto da espécie africana Agama agama podia se ‘endireitar’ no ar mesmo depois de saltos mal-sucedidos, Full decidiu estudá-lo melhor. Para isso, gravou seus movimentos por um trajeto que incluía correr por uma esteira em direção a uma plataforma – com trações variadas, de áspera a escorregadia – e saltar dela para uma superfície vertical.

A equipe de pesquisadores notou que, mesmo escorregando na plataforma, o animal era capaz de corrigir o erro antes de ‘pousar’, ajustando, para isso, o ângulo da cauda. A manobra, explicam os cientistas, segue o princípio de conservação do momento angular de um corpo, ligado à sua estabilidade e facilmente entendido quando pensamos num equilibrista: munido de um bastão, ele compensa a inclinação do próprio corpo para um lado ao pender o bastão para o outro.

Salto de lagarto
O lagarto se mantém estável ao saltar de uma plataforma escorregadia em direção a uma parede dobrando sua longa e fina cauda para cima, seguindo o princípio de conservação do momento angular de um corpo. (foto: Thomas Libby, Evan Chang-Siu e Pauline Jennings/ PolyPEDAL Lab e CiBER/UC Berkaley)

De forma semelhante, o lagarto se mantém estável no salto em questão ao dobrar sua longa e fina cauda para cima. Segundo a equipe, isto acontece porque ele dispõe de sensores para controlar esse equilíbrio.

Dos animais aos robôs

Para confirmar a explicação sobre o controle da cauda, os cientistas desenvolveram um modelo matemático e criaram um carro-robô – batizado Tailbot – do tamanho do lagarto, com uma cauda removível. Tailbot foi então submetido à queda de uma rampa, em duas situações.

Primeiro, sem que a cauda fosse sensoriada – o que fez o corpo ser lançado de modo rígido, indiferente à presença do apêndice. Já no segundo momento, a cauda assumiu uma angulação controlada matematicamente e, tal qual o lagarto, o robô conseguiu estabilizar seus movimentos, mantendo constante o ângulo do corpo.

“Pela primeira vez, mostramos que balançar a cauda para cima e para baixo para neutralizar a rotação do corpo é o que mantém os lagartos estáveis”, diz Full, que considera a natureza o melhor professor para o estudo que desenvolvem.

Assista ao vídeo, em inglês, preparado pelos pesquisadores com saltos do lagarto e do Tailbot

Ele adianta que a próxima etapa da pesquisa, já em desenvolvimento, é estudar o movimento da cauda em três dimensões, incluindo variáveis como a força sobre o chão e a transição do animal por diferentes superfícies – da parede para o solo e da areia para a grama, por exemplo.

“Esperamos continuar descobrindo sobre os princípios dos movimentos dos animais para traduzi-los em aplicações como o desenvolvimento desses robôs manobráveis, capazes de lidar com destroços de uma catástrofe e detectar mais rapidamente riscos químicos, biológicos ou nucleares”, exemplifica Full.

Segundo os pesquisadores, a previsão é de que esse modelo de robô – um dos cinco finalistas do prêmio de melhor artigo apresentado na Conferência Internacional sobre Robôs e Sistemas Inteligentes – passe a ser comercializado dentro de cinco a oito anos.


Carolina Drago
Ciência Hoje On-line