Meteorito ajuda a entender surgimento da vida

Uma nova hipótese para a origem do elemento fósforo na Terra pode ajudar a entender o surgimento da vida no planeta. Os meteoritos, sobretudo os com alto teor de ferro, podem ter sido a fonte do elemento químico que originou as primeiras biomoléculas, transformadas em organismos vivos após milhões de anos de evolução.

Há 4,5 bilhões de anos, cometas e meteoritos teriam trazido para a Terra os elementos necessários para o surgimento da vida. (arte: James V. Scotti, Universidade do Arizona)

O anúncio foi feito por Matthew Pasek e Dante Lauretta, pesquisadores do departamento de ciências planetárias da Universidade do Arizona. Os resultados foram apresentados no encontro nacional da Sociedade Química dos Estados Unidos realizado em agosto na Filadélfia e foram submetidos à publicação na revista Astrobiology .

O fósforo foi fundamental para o aparecimento dos seres vivos. Ele liga as bases do DNA e do RNA e é por isso considerado a “coluna vertebral” dessas moléculas. Está presente também no composto responsável pela estocagem e transferência de energia em reações bioquímicas — o ATP (trifosfato de adenosina) — e nas paredes celulares e ossos dos vertebrados.

Para isso, no entanto, o fosfato precisa ser solubilizado. O que intrigava a comunidade científica era justamente a ausência de uma fonte solúvel do elemento em nosso planeta.

“Até agora, a origem do fósforo na Terra era um mistério. Ele é encontrado em minerais como a apatita, que não apresentam o elemento na forma solúvel”, explica o pesquisador Dimas Augusto Morozin Zaia, do departamento de química da Universidade Estadual de Londrina (UEL). “O fosfato solúvel pode ser encontrado em alguns vulcões, mas em quantidades tão pequenas que é difícil acreditar que tenha sido esta sua origem.”

Lauretta já havia concluído, em estudos anteriores, que importantes biomoléculas que têm fósforo em sua composição poderiam ter se formado a partir da corrosão aquosa dos metais presentes nos meteoritos. Agora, ao lado de Pasek, ele pode ter identificado uma possível fonte para o fosfato solúvel na Terra.

Os pesquisadores analisaram os compostos resultantes de uma mistura de água desionizada com schreibersita — um composto metálico raro na Terra mas comum em meteoritos ricos em ferro. “A reação formou vários compostos à base de fósforo, inclusive um dos tipos de fosfato mais usados nas reações bioquímicas”, afirma Pasek.

 

À esq., Matthew Pasek ao lado de um tubo de ensaio com uma amostra do meteorito em que foi identificada a schreibersita. À dir., amostra do mineral ampliada no microscópio (fotos: Universidade do Arizona)

O fósforo chama ainda a atenção os cientistas por sua extrema raridade: apesar de sua importância para a vida, ele é encontrado em pouquíssimas quantidades na Terra. Para cada átomo desse elemento no planeta, são encontrados 2,8 milhões de hidrogênio e 1400 de oxigênio e nitrogênio. “Compreender o comportamento do fósforo nos primórdios da Terra é um caminho para desvendar o mistério da origem da vida”, afirma Pasek.

 

Para o professor Dimas Zaia, a descoberta deverá incrementar o estudo sobre o surgimento da vida no planeta. “O próximo passo é procurar mais meteoritos para se calcular a quantidade de fósforo solúvel trazida por eles para a Terra”, prevê. “A partir daí, poderemos confirmar a fonte do elemento e estudá-lo em suas condições originais.”

Isabel Levy
Ciência Hoje On-line
31/08/04