Morrer pelo nariz

 

O funcionamento dos receptores olfativos de uma grande variedade de insetos depende de um mesmo gene identificado por cientistas norte-americanos. Um estudo publicado na edição de fevereiro da revista Current Biology , mostrou que o gene, chamado Or83b, está presente no DNA desses artrópodes há pelo menos 250 milhões de anos. Como eles encontram e selecionam suas presas pelo olfato, a descoberta pode abrir caminho para o desenvolvimento de novas estratégias de controle de doenças e pragas transmitidas por insetos.  

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Em sentido horário, as quatro espécies estudadas: mosca-das-frutas, mosca-do-mediterrâneo, mosquito da malária e lagarta-da-espiga-de-milho (fotos: reprodução/ Current Biology )

O estudo se deteve sobre quatro espécies, a maior parte delas associada a grandes prejuízos na lavoura ou envolvida na transmissão de doenças. Foram analisados o mosquito causador da malária ( Anopheles gambiae ), que atinge cerca de 300 mil pessoas por ano em todo o mundo; a mosca-do-mediterrâneo ( Ceratitis capitata ), principal causadora de prejuízos em cultivos de frutas cítricas; e a lagarta-da-espiga-de-milho ( Heliothis zea ), que em sua fase adulta se transforma em mariposa e é responsável por grandes perdas nas lavouras de milho. Os cientistas avaliaram também a mosca-das-frutas ( Drosophila melanogaster ), um organismo modelo em estudos genéticos, que teve seu DNA seqüenciado em 2000.

O sentido do olfato de grande parte dos insetos funciona graças a um mecanismo bastante simples. Suas antenas são cobertas por pequenos pêlos sensíveis aos diferentes cheiros do ambiente. O contato das moléculas olfativas com esses pêlos funciona como um gatilho para os receptores olfativos que atuam nos extremos das células nervosas. Quando esses receptores são acionados, o organismo reconhece o cheiro. Há grupos específicos de receptores para cada espécie.

A equipe procurou identificar a região do DNA responsável pelo funcionamento dos receptores olfativos de cada uma das quatro espécies estudadas e constatou que se tratava de um mesmo gene para todas elas. A descoberta é surpreendente, pois esses insetos se diferenciaram na linha evolutiva há cerca de 250 milhões de anos.

A conclusão dos testes recentes representa a confirmação de uma suspeita levantada por um estudo de 2001. Pesquisadores dessa mesma equipe haviam implantado nessa ocasião o gene Or83b retirado de diferentes espécies em moscas-da-frutas mutantes, das quais esse mesmo gene havia sido retirado. O resultado do experimento foi a restauração total do olfato das moscas.

Os cientistas acreditam que essa informação possa ser de grande utilidade para a elaboração de estratégias de controle de insetos e pragas agrícolas. Um bloqueio químico temporário do gene seria uma possibilidade para manter mosquitos longe de humanos, evitar a transmissão de doenças e proteger cultivos agrícolas de pragas. “Ainda que insetos sejam animais bastante astutos, essa descoberta os torna vulneráveis a estratégias que bloqueiem seu olfato”, disse Leslie Vosshall, pesquisadora da Universidade Rockefeller e uma das autoras do estudo, em comunicado à imprensa.


Tiago Carvalho
Ciência Hoje on-line
03/03/05