Nova estratégia para vacina contra a Aids

 

Desde que a Aids se transformou num dos maiores problemas de saúde pública do mundo, várias iniciativas para se criar uma forma de impedir o contágio ou, pelo menos, de retardar a evolução dos sintomas têm sido feitas. Uma estratégia nunca tentada antes está sendo pesquisada na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Trata-se de uma vacina preventiva para ser aplicada nas mucosas, principalmente nas vias de contaminação.

“A forma mais comum de transmissão do HIV são as relações sexuais, apesar de existirem outras formas de contágio, como transfusão sangüínea e o uso de drogas injetáveis”, disse Aguinaldo Roberto Pinto, biomédico responsável pelo estudo. “A idéia é conseguir uma resposta imune na vagina ou no reto, porque estas são as duas principais vias de entrada do vírus.”

Pesquisador da UFSC aplica gotas de vacina na mucosa nasal de um camundongo (foto: Paulo Noronha/Agecom UFSC). 

A vacina é aplicada nas mucosas nasal ou vaginal porque tem a intenção de ser uma proteção local. A aplicação no nariz é utilizada porque essa mucosa tem ligações com todas as outras mucosas do corpo. Nessa fase da pesquisa a vacina foi administrada em gotas nas narinas ou na vagina dos camundongos. “Aplicamos duas doses com um intervalo de duas semanas entre elas, mas pretendemos testar outras formas de administração. Quando os testes forem realizados com humanos vamos estudar melhor a administração e a dosagem”, diz o professor.

Testes em camundongos na UFSC demonstraram que a nova vacina estimula uma resposta imune nos animais. Estudos de outros grupos também apontaram que ela poderá ser capaz de retardar o desenvolvimento do vírus e o aparecimento dos sintomas. Além disso, a quantidade de vírus na corrente sanguínea do infectado também pode ser reduzida, o que torna a chance de transmissão do vírus menor.

Essa vacina terá que ser aplicada antes da contaminação para garantir uma resposta do sistema imunológico já no momento do contágio. “As vacinas que impedem totalmente o contágio têm se mostrado ineficientes, por isso os pesquisadores optam por procurar algo que retarde o desenvolvimento da doença, apesar de não impedir a contaminação”, completa.

A maior parte dos estudos que desenvolvem vacinas contra o HIV utiliza adenovírus que causam uma espécie de gripe nos seres humanos, mas o grupo da UFSC optou por utilizar um adenovírus que causa uma enfermidade semelhante em chimpanzés. “Fizemos essa escolha porque o adenovírus humano, por estar livremente no ambiente, já infectou grande parte da população e as pessoas que já foram infectadas por ele têm uma resposta imune para esse vírus, o que torna a vacina ineficaz”, explicou. Ele ressaltou que a vacina não contém HIV – ela é formada por adenovírus recombinantes, ou seja, modificados geneticamente para possuir pedaços de proteínas do HIV. “Este vírus que injetamos é benéfico, não consegue se multiplicar no corpo, apenas estimula a resposta imunológica.”

O trabalho é feito pela parceria entre o Laboratório de Imunologia Aplicada da UFSC e o Instituto Wistar, uma instituição de pesquisa biomédica dos Estados Unidos, desde 2003. A linha de pesquisa é a mesma, mas os norte-americanos estão testando a mesma vacina para uma aplicação intramuscular e não nas mucosas, como no Brasil. Eles já iniciaram os testes da vacina com primatas, enquanto a UFSC ainda realiza testes com camundongos. Segundo Aguinaldo Pinto, esses testes ainda vão demorar a acontecer na pesquisa desenvolvida aqui. “Devido a seu alto custo, esses testes provavelmente serão feitos nos Estados Unidos. A pesquisa está bem mais adiantada lá, ainda não podemos dizer quando chegaremos a essa fase”, completa.

Franciane Lovati
Ciência Hoje On-line
27/06/2006