Descobertas recentes feitas por pesquisadores brasileiros acabam de ampliar as bases do conhecimento atual sobre o mal de Parkinson. Um estudo realizado pela Universidade de São Paulo (USP) mostra que a doença pode ter início em neurônios localizados no coração, no intestino e na bexiga urinária. Segundo os conceitos vigentes até então, a origem de todos os casos de Parkinson seria a degeneração de neurônios no cérebro.
O mal de Parkinson atinge cerca de 1% da população mundial com mais de 65 anos, segundo dados da Organização Mundial da Saúde. Embora a maior parte dos doentes tenha mais de 50 anos, há relatos da manifestação da doença em jovens.
Foi o que aconteceu com o ator Michael J. Fox, mundialmente famoso após protagonizar o filme De volta para o futuro (1985) e diagnosticado com Parkinson em 1991, aos 30 anos. Há casos em que as vítimas apresentam predisposição genética, porém isso também não é uma regra.
Nos casos clássicos de Parkinson, a manifestação motora da doença é o sintoma mais evidente. A pessoa apresenta tremores nas mãos, desequilíbrio, rigidez da face e lentidão e sofre alterações na fala, na escrita, na expressão facial e no olfato.
Isso acontece porque a degeneração das células nervosas localizadas no cérebro tem como consequência a diminuição da produção de uma substância conhecida como dopamina, responsável por controlar os impulsos do sistema nervoso involuntário.
Quebra de paradigma
No novo estudo, realizado por pesquisadores do Laboratório de Estereologia Estocástica e Anatomia Química (LSSCA) da Faculdade de Medicina Veterinária da USP, foram usados camundongos que tiveram seus genes manipulados para expressar o mal de Parkinson. Por meio de análise estereológica (estudo das partes sólidas em um corpo vivo) em três e quatro dimensões, associada a exames funcionais e bioquímicos, os pesquisadores identificaram casos em que a doença afetou primeiro células de outros órgãos.
Os sintomas iniciais apresentados por esses animais foram picos de pressão alta e baixa, taquicardia, atrofia do coração e diminuição da distribuição de fibras nervosas no órgão, além de incontinência urinária e fezes ressecadas.
De acordo com a equipe do LSSCA, esses sintomas indicam que o sistema nervoso inicialmente afetado foi o periférico (sistema nervoso autônomo), e não o central, como se imaginava que acontecesse em todos os casos de Parkinson. O cérebro foi afetado apenas na fase final da doença.
“Há um caso na literatura médica em que um paciente humano teve inicialmente sintomas periféricos da doença – exatamente como os camundongos usados no estudo – e só apresentou sintomas cerebrais quatro anos depois, quando então o Parkinson clássico se manifestou”, afirma o professor Antonio Augusto Coppi, responsável pelo LSSCA e coordenador do estudo.
Diagnóstico precoce
Coppi ressalta que a descoberta de outra provável rota de origem e evolução do Parkinson possibilitará o diagnóstico da doença durante sua fase silenciosa, que em alguns casos antecede a fase motora clássica. “Quando os sintomas silenciosos da doença, que antes não eram relacionados ao Parkinson, forem detectados mais precocemente, o tratamento poderá ser iniciado mais cedo”, diz. “Isso melhorará a qualidade de vida do paciente”, completa.
Segundo Coppi, mais de 30% das vítimas de Parkinson morrem por complicações cardíacas, embora existam diferentes origens e rotas de evolução da doença. No entanto, ainda não se sabe como o coração é afetado. “Nossa pesquisa visa também conhecer detalhadamente de que maneira a doença atinge esse órgão e usaremos a estereologia como uma das principais ferramentas de estudo”, acrescenta.
Descrito pela primeira vez em 1817, o mal de Parkinson é uma doença neurodegenerativa que até hoje continua sem cura. “Entretanto, poderemos no futuro usar o diagnóstico precoce para monitorar a cronologia da evolução do Parkinson e suavizar ou retardar seus sintomas”, finaliza Coppi.
Bruna Ventura
Ciência Hoje On-line