Ela media apenas 15 centímetros de comprimento e se assemelhava muito às tartarugas de água doce atuais. A pequena Atolchelys lepida acaba de ser descoberta por paleontólogos brasileiros no Morro do Chaves, em Alagoas, mas já traz grandes mudanças na história evolutiva dos quelônios. Para começar, ela é o fóssil de tartaruga mais antigo já encontrado no Brasil, com pelo menos 125 milhões de anos.
A datação do fóssil da tartaruga, feita a partir da análise da idade das rochas da camada em que foi encontrado, revela que a espécie teria vivido durante o Cretáceo Inferior e convido com os dinossauros. Até então, só havia evidências 12 milhões de anos mais recentes de tartarugas desse tipo (do grupo Pleurodira), também conhecidas pelo termo em inglês side-necked turtles, por causa do modo peculiar como retraem a cabeça no casco virando o pescoço para o lado.
Embora já existissem hipóteses que cogitavam uma origem mais remota para o grupo, nenhum fóssil que comprovasse essa ideia havia sido encontrado. Para o biólogo Pedro Romano, pesquisador da Universidade Federal de Viçosa (Minas Gerais) que coordenou a descrição da espécie, publicada no periódico Biology Letters, o achado foi uma boa surpresa.
“Até então só tínhamos descoberto peixes na região onde ela foi encontrada, no máximo alguns fragmentos de uma tartaruga que não pôde ser identificada”, conta. “Encontrar um fóssil de tartaruga tão importante como esse bem conservado foi incrível.”
O grupo Pleurodira ainda tem espécies viventes em toda a África e América do Sul. Alguns dos parentes vivos da espécie no Brasil são a tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa) e o tracajá (Podocnemis unifilis), ambos de água doce.
Os cientistas acreditam que o grupo tenha surgido no Norte do supercontinente Gondwana, que unia em um só território todos os continentes atuais do hemisfério Sul. Com o início da separação dos continentes, há cerca de 120 milhões de anos, as espécies de Pleurodira teriam ficado isoladas e evoluído formando novas famílias e espécies nos novos continentes.
Reorganização da árvore
A descoberta da nova espécie fóssil também levou a uma mudança na estrutura da árvore filogenética (que mostra a relação de parentesco) dos quelônios.
Pela análise da morfologia de fósseis de outras tartarugas encontrados previamente e de espécies viventes, os pesquisadores reestruturaram as linhagens das tartarugas Pleurodira, levando em conta a nova datação. Com isso, o grupo passou a incluir duas famílias de tartarugas, a dos Pelomedusoides, da qual Atolchelys lepida faz parte e que ainda tem espécies viventes na África, e a já extinta Araripemydidae.
“Mudou todo o conhecimento que tínhamos do grupo, foi uma grande reorganização da árvore filogenética”, afirma Romano. “Isso nos mostra que a evolução do grupo ainda não está totalmente esclarecida, mas é muito mais complexa do que se pensava.”
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line