Por sapos mais protegidos na América Latina

 

A Phyllomedusa ayeaye é uma espécie rara que habita áreas abertas ou arbustos perto de pequenas lagoas ou poças d’água. Seus ovos são depositados em folhas que ficam acima de pequenos cursos d’água e, ao eclodir, os girinos caem no riacho (fotos: Célio Haddad).

Os anfíbios formam um dos grupos mais ameaçados atualmente, com cerca de 35% de suas espécies sob risco de extinção. Um estudo pioneiro realizado por cientistas brasileiros pode ajudar a implantar estratégias mais eficazes para reduzir o declínio populacional de anuros (sapos, rãs e pererecas). O grupo propõe a criação, na América Latina – região que abriga o maior número de espécies de anfíbios do mundo –, de zonas prioritárias de conservação definidas com base no comportamento reprodutivo desses animais.

Segundo o biólogo Rafael Loyola, do Departamento de Zoologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o objetivo da pesquisa é concentrar esforços em áreas que possam abrigar um grande número de espécies. “Temos muito pouco tempo e recursos insuficientes para conservar espécies em toda a América Latina”, afirma. “Buscamos delimitar regiões que, em conjunto, ofereçam condições para a sobrevivência de todas as espécies.”

Esta é a primeira vez que se realiza um estudo voltado para a criação de áreas prioritárias de preservação que levem em conta a reprodução dos anuros. Além do grupo da Unicamp, participaram da pesquisa cientistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro (SP) e da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), no Rio Grande do Sul. A proposta da equipe foi apresentada em um artigo na revista PLoS One desta semana.

Os pesquisadores estudaram mais de 700 espécies de sapos ameaçados e as dividiram em dois grupos: aqueles cujo ciclo de vida tem uma fase aquática (ou fase de girino) e os que não a apresentam. Loyola afirma que esse fator é de suma importância para a delimitação das áreas, pois os dois grupos são afetados pela ação humana de maneiras distintas.

“Os animais com fase aquática sofrem mais com a poluição de rios e lagoas e com a separação entre as áreas de mata e os corpos d’água, que ocorre, por exemplo, com o avanço das pastagens”, explica o biólogo. “Por sua vez, os animais sem fase aquática sofrem mais com a fragmentação de seu hábitat.”

A espécie Bokermannohyla izecksohni, normalmente encontrada sob a vegetação ou no chão de florestas perto de riachos, se reproduz em poças temporárias de água.

Segundo os pesquisadores, a ação humana, que leva à diminuição do hábitat dos anfíbios, é o principal fator que coloca esses animais entre os mais ameaçados do planeta. Além disso, esse grupo é afetado por doenças: “Os anfíbios sofrem com o avanço dos ataques do fungo Batrachochytrium dendrobatidis, que acomete especificamente esses animais”, acrescenta o biólogo. “O aumento das temperaturas médias, provocado pelas mudanças climáticas, está causando a proliferação desses fungos”, explica.

Áreas prioritárias de preservação
O estudo delimitou um total de 66 regiões, algumas específicas para cada grupo de anuros e outras próprias para a conservação dos dois. Entre as principais áreas apontadas, estão a mata atlântica, os Andes tropicais e a parte norte e central da América Latina.

Loyola destaca a necessidade de se desenvolverem atualmente estratégias mais eficientes que englobem grupos de anuros com diferentes comportamentos reprodutivos. “Em geral, as estratégias de conservação favorecem os animais sem fase aquática”, diz. E alerta: “Se os modos de reprodução dos sapos não forem considerados, a maioria das regiões essenciais para espécies que possuem fase de girino será perdida.” 

Igor Waltz
Ciência Hoje On-line
07/05/2008