Raios solares também prejudicam peixes

 


Não somos só nós, seres humanos, que sofremos com os impactos da radiação ultravioleta (UV) no corpo. Os raios solares também fazem mal aos peixes, segundo comprovou estudo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Danos ao material genético, queimadura do tecido epitelial e possível prejuízo à continuidade da espécie estão entre os efeitos maléficos que a exposição contínua aos raios UVA e UVB pode causar a esses animais. O aquecimento global e o desmatamento agravam a situação, pois permitem que a radiação atinja os corpos hídricos de forma cada vez mais intensa.

Foram estudadas em laboratório as conseqüências da radiação ultravioleta em duas espécies de peixe, o pirarucu e o tambaqui, ambos naturais da bacia amazônica, local onde a incidência de raios UV é maior. Nessa região, as águas têm como característica a baixa quantidade de oxigênio, o que obriga os peixes a ir até a superfície para respirar. E é justamente sobre essas camadas superficiais dos rios que incidem os raios solares, pois os materiais em suspensão na água os impedem de penetrar no fundo.

Um exemplar de tambaqui ( Colossoma macropomum ) submetido em laboratório à radiação ultravioleta (à direita) sofreu lesão epitelial na parte superior da cabeça, enquanto o peixe que não ficou exposto aos raios UV (à esquerda) não apresentou queimaduras na pele. (Fotos: Cristhian Amado Castro Pérez).

“Os dois peixes escolhidos são espécies que têm o hábito de subir para respirar na camada superior da lâmina d´água ou na própria atmosfera. Como estão sempre em contato com os raios, foi possível avaliar melhor a dimensão do impacto”, explica o biólogo Adalberto Luis Val, diretor do Inpa e responsável pelo projeto. “Além disso, são espécies muito usadas na aqüicultura (criação de peixes) e cultivadas em tanques rasos e sem cobertura, que ficam continuamente expostos aos raios UVA e UVB”, complementa.

Em laboratório, o pirarucu e o tambaqui foram submetidos a fontes de raios UV de diferentes amplitudes e por tempos que variaram de trinta a noventa minutos. Essa simulação, no entanto, usou uma quantidade mais dosada de radiação do que a existente nos ambientes naturais desses animais. Ainda assim, os pesquisadores perceberam danos moleculares sérios nos cromossomos dos peixes. “Houve quebra do DNA dos animais. Se os mesmos não conseguirem reparar esse dano, ele poderá acarretar mutações”, explica Val. “Infelizmente, ainda não medimos a real capacidade dos peixes de realizar esse reparo.”

O biólogo ressalta ainda que a ocorrência de mutações pode causar graves problemas para as populações de peixes e até para toda a espécie. “Já há relatos de mortandade em massa”, diz. “Também percebemos o efeito das radiações sobre o zooplâncton, que serve de alimento para esses peixes.” Em peixes criados em tanques, observou-se perda de peso e de fertilidade.

O estudo mostrou também que queimaduras por exposição excessiva aos raios UV não acontecem só com seres humanos: “Apareceram danos epiteliais muito fortes”, conta Val. “A vitamina C presente nos animais ajuda a protegê-los dos raios. Nos testes em que os peixes não receberam dosagem extra desse composto, os resultados foram ainda piores”, complementa.

Para agravar o problema, o desmatamento na Amazônia contribui para a maior incidência dos raios ultravioleta sobre os peixes, uma vez que a falta de cobertura vegetal e, conseqüentemente, da sombra das árvores, desprotege os rios. Desflorestar também provoca o assoreamento (acúmulo de sedimentos no leito do rio), o que diminui o tamanho da coluna d´água e expõe ainda mais os peixes à superfície. “A tudo isso podemos somar o aumento de gases do efeito estufa e o aquecimento global, que implicam em maior ocorrência de raios ultravioleta”, conclui.

Juliana Tinoco
Especial para Ciência Hoje On-line
20/03/2007