Saúde florestal em pauta

Fontes de alimentos, energia e praticamente todos os produtos de que fazemos uso, as florestas suprem os humanos em muitos sentidos. Elas ocupam cerca de 30% do planeta e, mesmo assim, abusamos de sua boa vontade, devastando sua saúde. Com essa preocupação, a revista Science publica, nesta quinta-feira (20/08), uma seleção especial de artigos sobre a saúde das florestas ao redor do mundo.

Convidado pela revista para analisar, em poucas páginas, o complexo problema do declínio das florestas causado pelas mudanças globais, o brasileiro Paulo Brando, engenheiro florestal do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), explicou à CH On-line que a saúde de uma floresta pode ser definida de várias formas. A primeira é a ausência de um patógeno específico que cause alguma doença, como pragas. Outra possibilidade é a análise da quantidade de biomassa presente no ambiente – se a fauna, por exemplo, está reduzida, a floresta pode ser considerada doente.

Brando assina, com colegas da Alemanha e dos Estados Unidos, um artigo de revisão sobre estudos acerca da saúde das florestas em diferentes regiões do planeta. Para medir o quanto as florestas mudaram nos últimos tempos, grupos de pesquisa do mundo todo usam critérios tão variados quanto a biodiversidade que observam. “Alguns pesquisadores viajam até o meio das matas simplesmente para saber se as árvores estão doentes”, exemplifica Brando.

Mudanças climáticas globais têm enorme influência sobre a saúde florestal: florestas mais quentes tendem a ficar mais doentes

As sempre comentadas mudanças climáticas globais têm enorme influência sobre a saúde florestal: florestas mais quentes tendem a ficar mais doentes. “Isso ocorre porque a quantidade de água fica reduzida, tornando os incêndios mais intensos”, explica o cientista. Se, por um lado, é possível observar tendências globais como esta, por outro, a avaliação da saúde das florestas no globo é um desafio sem tamanho. “Se uma árvore está doente, é fácil saber. Mas como saber se uma floresta inteira está? Qual é o número exato de árvores doentes para caracterizar uma floresta adoecida?”, questiona Brando.

Para o biólogo Jean Remy Guimarães, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro e colunista da CH On-line, o trabalho é um grande avanço nesse campo de pesquisa, pois aperfeiçoa estudos já feitos. “É essencial entender a situação atual das florestas para, então, tentar prever como vai ser o futuro delas”, diz. “E o futuro delas também é o nosso, não é?”

 

Futuro ainda incerto

Em quatro artigos de revisão, a Science desta semana dá pistas do quão devastados estão diferentes tipos de florestas, entre eles as boreais (que cobrem regiões mais frias), as temperadas (localizadas em lugares de clima ameno) e até as plantadas (ou seja, cultivadas pelo próprio homem). Um estudo que nos toca diretamente foi publicado por Simon Lewis, da Universidade de Leeds, na Inglaterra, e visa determinar o impacto dos humanos em florestas tropicais, em termos de estoques de carbono nas árvores, além de avaliar as consequências de eventos como queimadas e incêndios.

Florestas em risco
Compreender a saúde atual das florestas, inclusive a forma como elas se recuperam após queimadas e outros eventos, é fundamental para tentar prever como essas regiões estarão no futuro. (foto: Yan Boulnager)

Os resultados mostram que são muito poucas as florestas tropicais ainda intactas, isto é, que tenham escapado dos impactos da agricultura. “A maioria das florestas que se salvaram estão na Amazônia, com poucos remanescentes na África e na Ásia”, conta Lewis à CH On-line. Ainda assim, não temos motivo para comemorar. “As mudanças climáticas terão grandes impactos nas florestas tropicais. A quantidade de carbono que as florestas vão captar no futuro é incerta, assim como a resposta das florestas ao carbono extra também é incerta”, completa o autor.

Uma preocupação dos especialistas é que, conforme o clima esquenta, as espécies precisam encontrar novos hábitats para acompanhar o ambiente em mudança. Porém, o estado fragmentado das florestas tropicais pode não permitir esse movimento, levando à extinção de muitas espécies.

De uma maneira geral, ainda é difícil prever como estará a saúde das florestas em um futuro distante. “Isso depende de como será nossa postura daqui em diante: se iremos adotar novas medidas para reverter esse cenário ou continuar com os velhos hábitos”, destaca Brando. O engenheiro aponta que, atualmente, o mais importante é compreender o complexo processo que as florestas do planeta estão passando. Apenas estudando a fundo o estado de saúde de nossas árvores será possível salvá-las. “Criar políticas de proteção a essas queridas aliadas já seria um bom começo”, arrisca.

Valentina Leite
Instituto Ciência Hoje/ RJ