Sexo forte virtual

As mulheres ganham mais dinheiro e são mais avessas a riscos que os homens. Pelo menos no mundo virtual. Esta é uma das conclusões de um estudo que analisou o jogo multijogador massivo on-line (MMOG) Pardus para identificar diferenças na maneira como jogadores e jogadoras se comportavam e administravam suas redes sociais.

Publicado hoje (07/02) na Scientific Reports, o trabalho foi realizado por pesquisadores da Universidade Médica de Viena, na Áustria. Eles catalogaram as ações dos jogadores no Pardus por 856 dias, o que resultou numa amostragem final de 34.210 usuários, sendo que 3.603 eram mulheres.

O Pardus é um jogo de ficção científica onde os personagens possuem uma astronave e podem fazer comércio, socializar etc., geralmente com o objetivo de ganhar dinheiro, status, respeito e fama. Para jogar, a pessoa cria um personagem e escolhe seu sexo, que não pode ser mudado depois.

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Pardus é um jogo virtual de ficção científica em que os personagens possuem uma astronave e realizam ações com o objetivo de ganhar dinheiro, status, respeito e fama. Para jogar, é preciso criar um personagem e escolher seu sexo, que não poderá ser alterado. (imagem: reprodução)

A possibilidade de um jogador escolher uma personagem feminina e vice-versa é considerada pelos cientistas. “Não fizemos um levantamento no Pardus, mas outros trabalhos apontam um índice médio de 15% de troca de gênero e temos razões para acreditar que no jogo estudado não é muito diferente; para as nossas conclusões, essa fração pode ser considerada mínima”, afirma Stefan Thurner, coautor do trabalho.

Ricas e conservadoras

Ao analisarem os dados, Thurner e seu colega descobriram que as mulheres estão muito mais engajadas em atividades econômicas dentro do jogo, acumulando mais riqueza que os homens. Além disso, o comportamento mais arriscado dos jogadores masculinos resulta em um número maior de mortes de personagens homens.

As mulheres também são mais ativas na realização de ações consideradas positivas no jogo – comunicação, comércio e conversas –, enquanto os homens se concentram mais nas negativas: ataques, marcação de inimigos e coleta de recompensas. No entanto, quando um jogador contracena com uma mulher, ele tende a realizar mais ações positivas.

Ou seja, as mulheres atraem o comportamento positivo dos homens. “Acreditamos que essa é uma característica biológica que acaba aparecendo no jogo e pode estar relacionada com comportamento de corte e reprodução que está programado em nós”, sugere Thurner.

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No jogo, as mulheres estão mais envolvidas em ações positivas do que os homens. Mas elas atraem o comportamento positivo deles, o que os pesquisadores consideram uma característica biológica presente na espécie humana. (imagem: Grigory Kapustkin/ Bayer & Szell OG)

Ele ressalta que os homens também respondem mais rápido a pedidos de amizade e mais lentamente a ações negativas quando ambas as ações são oriundas de mulheres. Tanto homens como mulheres tendem a comercializar e se comunicar mais com jogadoras.

Redes e gênero

As redes sociais são o que os pesquisadores chamam de multiplex: são várias redes distintas – comunicação, amizade etc. – que utilizam os mesmos nós, no caso, os jogadores. Thurner e seu colega também analisaram como os homens e as mulheres organizam suas redes no Pardus.

As mulheres possuem 15% mais parceiros de comunicação e comércio, mas os parceiros dos homens têm mais parceiros do que os das mulheres. Ou seja, são mais bem conectados. No entanto, o jogo não permite que um jogador saiba o número de conexões que o seu parceiro tem, por isso os homens usam sua percepção da importância de um outro jogador para estabelecer contato com ele.

“Por exemplo, na vida real, não sabemos quem um político conhece, mas supomos que ele seja importante e tenha muitos contatos. Essa percepção parece ser diferente em homens e mulheres, e essa diferença se manifesta na estruturação das redes, onde podemos observá-la”, explica Thurner.

Esses e outros achados descritos no artigo indicam que as mulheres investem em redes mais estáveis e seguras

Esses e outros achados descritos no artigo indicam que as mulheres investem em redes mais estáveis e seguras. “Esse fenômeno não pode ser associado a dinâmicas sociais de grupo, como no Facebook, porque, como já dito, os jogadores não têm acesso às conexões dos outros”, ressalta o pesquisador. “Trata-se de uma evidência forte de que essas diferenças são de origem biológica e específicas de gênero”, conclui.

O pesquisador ainda não pensa em aplicações práticas para seus achados. “Por enquanto, é pesquisa básica, mas redes sociais estão entre as coisas mais importantes para os seres humanos e descobrir que eles são diferentes num nível tão básico é animador”, declara Thurner.

Fred Furtado
Ciência Hoje/ RJ