Um universo em seu braço

As bactérias foram identificadas a partir de amostras coletadas na região interna do antebraço de seis indivíduos, três homens e três mulheres (foto: Zhan Gao / Martin Blaser).

Uma pequena porção do seu braço pode abrigar dezenas de espécies de bactérias – e provavelmente não são as mesmas encontradas na mesma região da pele do seu vizinho. A conclusão é de uma equipe da Escola de Medicina da Universidade de Nova York (EUA) que fez o primeiro levantamento molecular das bactérias presentes na pele humana, a partir de amostras coletadas de seis indivíduos sadios.

Foram identificadas 182 espécies, pertencentes a 91 gêneros, com uma média de 48 espécies para cada indivíduo. Cerca de 8% das espécies encontradas eram desconhecidas pela ciência. Oito filos (grandes grupos nos quais são divididas as bactérias) estavam representados, embora 95% das espécies pertencessem a três filos – Actinobacteria, Firmicutes e Proteobacteria.

Em uma nova análise, feita com quatro dos seis indivíduos alguns meses depois da primeira coleta, foram encontradas 65 espécies, pertencentes a 28 gêneros. Nem todas elas haviam sido identificadas no primeiro levantamento, o que mostra que há bactérias “residentes fixas” na pele humana e outras que estão ali de passagem. A composição da microbiota da pele pode variar em função de fatores como temperatura, umidade, sexo ou mesmo o uso de cosméticos. 

Chamou a atenção dos cientistas a variabilidade de espécies encontradas entre os indivíduos. Apenas quatro foram identificadas no braço de todos os seis – Propionibacterium acnes , Corynebacterium tuberculostearicum , Streptococcus mitis e Finegoldia AB109769. “A maior parte dos médicos jamais ouviu falar delas, já que eles estão mais preocupados com bactérias patógenas”, disse à CH On-line o médico Martin Blaser, autor principal do estudo, publicado nesta semana na página na Internet da revista PNAS .

A Propionibacterium acnes é uma das únicas quatro espécies de bactéria que foram identificados no braço de todos os seis participantes do estudo (foto: Universidade de Lille-2).

A equipe usou um método molecular que identificou regiões específicas do genoma das bactérias e comparou as seqüências encontradas com informações disponíveis em bancos de dados. Essa abordagem permitiu ao grupo identificar a presença de espécies que não seria possível isolar com as técnicas convencionais.

Residentes do corpo humano
O estudo se inscreve em um esforço mais amplo para mapear as bactérias que habitam nosso organismo. “É possível que entre 3 mil e 10 mil espécies de bactérias sejam residentes fixas do corpo humano”, estima Blaser. Sua equipe já havia estudado as bactérias presentes no estômago e no esôfago. “Os filos de bactérias majoritários na pele são os mesmos que predominam no estômago e no esôfago”, conta ele.

As conclusões precisam ainda ser expandidas em estudos com um número maior de indivíduos e com amostras de pele extraídas de outras regiões do corpo. A equipe pretende ainda entender em que medida a composição das bactérias da pele é afetada no caso de doenças, já que o estudo se limitou a investigar indivíduos sadios.

“Acreditamos que encontraremos espécies diferentes na pele de indivíduos que sofrem de doenças como psoríase ou eczema”, conta Blaser. “Encontrar bactérias que sirvam de marcadores para determinadas doenças poderia levar à elaboração de métodos de diagnóstico e quem sabe até ao desenvolvimento de novas drogas.” 

Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line
05/02/2007