A análise do cérebro de diferentes animais mostrou que o aumento do tamanho do órgão não é proporcional ao aumento da capacidade de processar informações. (Crédito: Suzana Herculano-Houzel).

Que regras a natureza utiliza para construir a complexa estrutura do cérebro? Quais são as relações entre o tamanho do cérebro e a sua capacidade de processar informações? Um estudo recente foi em busca dessas respostas e descobriu que o volume do córtex não é a única característica, e talvez nem mesmo a principal, a ser analisada para elucidar essas questões. Na verdade, quando o tamanho do cérebro aumenta, a proporção de neurônios nessa região permanece constante e o aumento significativo do número dessas células neuronais ocorre na região conhecida como cerebelo.

A pesquisa, coordenada pela neurocientista Suzana Herculano-Houzel, do Laboratório de Neuroanatomia Comparativa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), comparou o cérebro de seis espécies de roedores – de camundongos a capivaras – para tentar descobrir as regras que regem o aumento desse órgão em animais de tamanhos tão distintos (um camundongo tem cerca de 8 cm e pesa por volta de 30 g, enquanto uma capivara pode medir mais de 1 m e chegar a 45 kg). Os pesquisadores partiram da premissa, aceita no meio científico, de que, quanto mais neurônios, maior o poder do cérebro de processar informações.

A pesquisa revelou que, em roedores, o córtex – área responsável por funções como a comunicação – sempre possui 18% do total de neurônios e que essa área pode estar supervalorizada nos estudos. “Provamos que o volume do córtex é um indicativo falho da capacidade de processamento do cérebro, uma vez que os neurônios se distribuem de forma heterogênea”, conta Herculano-Houzel. Já o cerebelo, região menos estudada, apresentou os maiores aumentos do número de células neuronais, o que, segundo a pesquisadora, indica que ele pode exercer mais funções do que somente as funções motoras que lhe são normalmente atribuídas. “Se pensarmos em eficiência como sendo a capacidade de armazenar mais células neuronais em um espaço menor, perceberemos a importância do cerebelo, uma estrutura pequena em relação ao córtex, mas que abriga um crescente número de neurônios quando comparamos uma espécie menor, como o camundongo, com uma maior, como a capivara”, explica a neurocientista.

Os pesquisadores notaram também que a razão entre a massa total de células e a massa total de neurônios permanece constante nas diferentes espécies e que o número de células glia (que colaboram com a transmissão de sinais entre os neurônios e dão suporte metabólico a eles) também cresce proporcionalmente ao aumento do número de neurônios. Além disso, os próprios neurônios ficam maiores quando o cérebro cresce.

Novas técnicas
A realização do trabalho só foi possível graças a uma nova técnica de contagem de células desenvolvida pela equipe, na qual o tecido cerebral é dissolvido, restando apenas os núcleos das células, identificados através de anticorpos. “Tradicionalmente, os estudos de tamanho do cérebro utilizam o volume como ferramenta, mas ficou claro que esse método é impreciso”, diz a pesquisadora.

A equipe do laboratório já iniciou a nova fase do projeto, na qual serão estudadas diferentes espécies de primatas. Os resultados devem aparecer já neste ano, mas os pesquisadores acreditam que algumas regras descobertas no estudo com roedores devem permanecer. O fato de a ordem Primates, da qual fazem parte micos, gorilas e chimpanzés, abrigar animais com grande capacidade cognitiva, mas de cérebros não muito maiores que o de uma capivara, por exemplo, sugere que a natureza encontrou um caminho para aumentar a eficiência sem aumentar o tamanho, fazendo jus ao velho ditado de que “tamanho não é documento”.

Mariana Ferraz
Ciência Hoje/RJ

 

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