Radicado nos Estados Unidos, o psiquiatra inglês Peter Whybrow, diretor do Instituto Semel para Neurociência e Comportamento Humano da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, é referência quando o assunto é depressão e distúrbios maníaco-depressivos.
Ficou conhecido inicialmente por seus trabalhos sobre os efeitos de hormônios da tireoide no cérebro e no comportamento humano, mas passou a se dedicar à escrita de livros para o público geral. O último, American mania: when more is not enough (Mania americana: quando mais não é o bastante, ainda não traduzido no Brasil), além de elogiado pela comunidade científica, foi considerado um dos mais notáveis de 2005 pelo jornal The New York Times.
Na obra, Whybrow mescla história, filosofia e neurociência para analisar como o modo de vida atual foi moldado pela forma como nosso cérebro funciona. Ele acredita que o consumismo, a dedicação extrema ao trabalho e a dependência de aparelhos eletrônicos, entre outras tendências, são efeitos negativos da evolução humana que precisam mudar para garantir a sobrevivência da nossa espécie.
Em visita a Curitiba para participar de um simpósio internacional de neurociência, o psiquiatra conversou com Ciência Hoje.
Revista CH: Ultimamente tem se falado muito nos benefícios da cetamina contra a depressão. O que o senhor acha dessa substância?
Peter Whybrow: Há evidências de que a injeção de cetamina por via intravenosa faz com que o paciente se sinta melhor mais rapidamente. Os medicamentos antidepressivos geralmente levam de duas a três semanas para começar a funcionar. A cetamina tem os mesmos efeitos químicos no cérebro, porém eles são obtidos de modo muito mais rápido. Ou seja, essa é uma intervenção de curto prazo. A cetamina é uma droga que merece ser investigada, mas não funciona no que diz respeito ao tratamento de longo prazo da depressão. É preciso entender que a depressão não é consequência apenas de mudanças químicas no cérebro.
O que é exatamente a depressão?
A alteração química é só uma parte do problema. A depressão é uma disfunção no lobo frontal, que é a parte mais, digamos, ‘humana’ do cérebro; e no sistema límbico, que é a parte emocional. Na depressão, a interação entre essas partes diminui. É como uma via interrompida em uma grande cidade; em consequência disso, todo o trânsito fica mais lento. O que os antidepressivos fazem é acelerar o fluxo de informações, mas, de fato, não atacam o problema fundamental, que pode ser resolvido com psicoterapia ou com mudanças de comportamento. A depressão é um problema sério hoje, em boa parte porque a vida se tornou muito estressante. A depressão não é um problema genético, mas um problema cultural.
Então o modo de vida atual, em que as pessoas estão cada vez mais atarefadas e dependentes de aparatos eletrônicos, tem alguma repercussão na incidência de casos de depressão?
É difícil afirmar isso categoricamente. Mas há evidências de que uma exposição maior de crianças pequenas a meios eletrônicos, como televisão, internet e videogames, desenvolve mais o pensamento de curto prazo, o que traz problemas. Elas não são capazes de estudar bem, por exemplo, por ter momentos de atenção muito curtos para integrar as informações adequadamente. Um desafio para educadores é ajudar crianças e jovens a explorar a tecnologia da informação de modo crítico. Infelizmente, as novas tecnologias têm forte poder de sedução inclusive na sala de aula. Crianças e jovens usam laptops em sala, mas em geral os professores não orientam de modo adequado como usar as informações encontradas. Por outro lado, as novas tecnologias permitem obter informações que antes não estavam disponíveis. Acho que precisamos aprender a usar as novas ferramentas de modo útil e com senso crítico.
Por falar em educação, qual sua opinião sobre as chamadas drogas do futuro, que seriam ministradas não para tratar doenças, mas para tornar as pessoas mais inteligentes, por exemplo?
Sou cético quanto a isso; não acho que existam drogas que aumentem a inteligência. Esse é outro problema da mentalidade de curto prazo: a ideia de que alguém pode se tornar um físico apenas tomando pílulas. Isso não existe. O que somos capazes de fazer é tornar camundongos de laboratório mais espertos, fazendo alterações genéticas. Eles passam a completar um labirinto mais rapidamente, por exemplo. Mas isso é diferente de melhorar a inteligência de alguém especificamente.
Mas se isso fosse possível, o senhor consideraria eticamente aceitável?