Fêmea de Sabethes cyaneus sorve sangue em pele humana. As pernas posteriores se dobram sobre a cabeça, e as pernas médias têm ‘remos’ de escamas finas e longas. O corpo apresenta coloração azul metálica. Perto da probóscida, que perfura a pele, ficam as antenas pilosas (foto cedida por Leonard E. Munstermann / Yale University).

Quando o assunto é mosquito, a primeira idéia que em geral vem à cabeça das pessoas é que eles devem ser aniquilados. Só poucos compreendem a importância de estudá-los. É preciso conhecê-los bem para saber, entre outras coisas, como vivem, quais oferecem algum tipo de risco para o homem e para os animais, e como combatê-los.

Seus hábitos e aparência variam muito. Os que voam e picam à noite geralmente têm cores discretas (marrom, bege, preto e cinza), enquanto os de atividade diurna são bastante coloridos (podem ser azuis, verdes, dourados, púrpura etc.) e às vezes apresentam um brilho metálico. Tornam-se especialmente bonitos quando recebem raios solares e os refletem.

Esses mosquitos são os sabetinos, cientificamente incluídos na tribo Sabethini. Das 375 espécies conhecidas no mundo, 218 estão no continente americano e 124 já foram encontradas no Brasil, onde vivem em geral dentro da mata. Estudos de mosquitos em áreas de florestas no Sul e Sudeste brasileiro levaram à identificação, respectivamente, de 12 e 34 espécies de sabetinos, o que revela uma elevada diversidade. Apesar de sua beleza, de seu colorido atraente e de seus hábitos curiosos, os sabetinos são pouco conhecidos do grande público.

As cores fortes dos sabetinos sugerem a denominação ‘mosquitos-borboletas’, a partir da expressão inglesa butterfly of mosquitoes , proposta para o gênero Sabethes . Se sua beleza já é suficiente para atrair nossa atenção, o interesse médico justifica plenamente que sejam investigados com afinco. Além de suas picadas serem incômodas, suspeita-se que transmitam alguns tipos de vírus. Procuraremos oferecer aqui alguns dados sobre sua biologia, que é diferente da dos demais mosquitos.

Quem vê um sabetino ao microscópio fica admirado com a vivacidade de suas cores. Várias espécies do gênero Sabethes apresentam longas escamas nas pernas, formando ‘remos’ bem visíveis a olho nu. Sua coloração é provavelmente útil para o relacionamento entre os sexos, para a corte e a cópula, já que não formam enxames como os outros grupos. O pequeno Limatus durhamii , com escamas metálicas douradas, prateadas, azuis e vermelhas, pode ser visto voando devagar, com a probóscida (tromba) voltada para baixo, como que para expor uma conspícua mancha azul, margeada de negro, na região dorsal.

Discreta aterrissagem

Um sabetino típico pica com a perna posterior dobrada sobre a cabeça. O lábio (parte da probóscida) está dobrado para que os estiletes possam penetrar na pele. O abdome, com manchas laterais claras de forma triangular, está inchado devido à presença de sangue (foto cedida por Genilton J. Vieira / IOC-Fiocruz).

De atividade diurna, um sabetino não pousa no hospedeiro logo que o vê. Em geral, ele o rodeia lenta e timidamente, com suas pernas finas e longas bem abertas antes da discreta ‘aterrissagem’ para picar. Se o hospedeiro se mexe, ele foge depressa. Ao pousar, as pernas posteriores ficam tão dobradas por cima do corpo que passam sobre a cabeça.

Como os mosquitos têm que disputar espaço com seus concorrentes, algumas espécies se especializaram em ‘atacar’ em certos horários, outras escolhem seus hospedeiros e outras ainda dão preferência a partes específicas do corpo do indivíduo atacado. Vários Sabethes preferem picar a cabeça; alguns escolhem especificamente a ponta do nariz do hospedeiro.

Pode parecer estranho que mosquitos tentem nos picar à luz do dia, quando estamos ativos (convém lembrar que somos hospedeiros acidentais quando adentramos uma floresta ou dela nos aproximamos). Eles picam mamíferos, muitos dos quais costumam ficar pouco ativos nas horas mais quentes do dia, como os macacos, os gambás e as onças. Os mosquitos Phoniomyia têm pernas e probóscida longas, indicando que podem sugar hospedeiros de pêlos compridos e pele espessa. Embora os sabetinos em geral ‘ataquem’ dentro da floresta, algumas espécies podem entrar em domicílios para picar, principalmente se estes ficarem próximos de florestas.

As formas imaturas (ovos, larvas e pupas) dos sabetinos se desenvolvem na água contida em recipientes formados por plantas. As fêmeas põem ovos na água acumulada em bromélias, bambus furados ou cortados, ocos de árvores, frutas cortadas e caídas no solo e outras plantas. Estudos feitos em bromélias indicam que seus ‘tanques’ são ricos em animais: mosquitos de várias espécies, quironomídeos, mutucas, larvas de libélulas, besouros e moluscos…

As larvas dos sabetinos são em geral predadoras, principalmente de outras larvas de mosquitos, até mesmo das de seus irmãos. Diante disso e do fato de as fêmeas depositarem poucos ovos em cada criadouro, a quantidade de larvas encontradas costuma ser pequena. Larvas do gênero Wyeomyia são encontradas em bromélias da mata atlântica, e as fêmeas do gênero Sabethes costumam pôr seus ovos em ocos de árvore e em bambus furados.

Carlos Brisola Marcondes
Departamento de Microbiologia e Parasitologia,
Universidade Federal de Santa Catarina
Anne Zillikens
Instituto de Zoologia,
Universidade de Tübingen (Alemanha).

 

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