Na última década, a área de história da ciência no Brasil tem emplacado bons artigos em revistas internacionais de prestígio. E essa internacionalização vem lhe valendo reconhecimento. Caso emblemático dessa boa safra ganhou destaque elogioso na revista Nature Physics.
O artigo em questão se chama ‘Quantum dissidents’ (Dissidentes quânticos) e foi publicado por Olival Freire Jr., do Instituto de Física da Universidade Federal da Bahia (UFBa), no periódico Studies in History and Philosphy of Modern Physics. O trabalho traz o esboço biográfico de nove pesquisadores que, cada um a seu modo, transformaram em respeitável campo de pesquisa a área sobre os fundamentos da física, em uma época em que o tema ou era tabu, ou era mera ‘filosofia’.
Esses pioneiros enfrentaram obstáculos, pondo, muitas vezes, a carreira em risco. Fundamentos da física, no caso, são as chamadas interpretações da mecânica quântica, teoria que lida com o microuniverso dos átomos e das moléculas.
O artigo, por meio dessas breves biografias, vai mostrando ao leitor toda a (bela) complexidade histórica em torno de um assunto que, para a maioria dos físicos da década de 1960, era tido como completamente ‘resolvido’ pelo físico dinamarquês Niels Bohr (1875-1962) e seguidores – apesar de essas ideias sempre terem enfrentado a profunda e contundente discordância de Albert Einstein (1879-1955).
Na opinião desta coluna, um dos destaques do texto é mostrar como o cenário de rebeldia de maio de 1968 na Europa e nos Estados Unidos influenciou a tomada de decisão de alguns desses dissidentes. Nas palavras de um deles: “a guerra do Vietnã dominou os pensamentos políticos da minha geração. Sendo um jovem estudante dessa era de pensamento revolucionário, eu naturalmente queria ‘chacoalhar o mundo’”.
Freire Jr. vai entremeando semelhanças, discórdias, teimosias e idiossincrasias desses rebeldes, para mostrar que a retomada desse campo está longe de ser apenas marcado por resultados experimentais e artigos. Além disso, a ‘mera filosofia’ exercida por esses dissidentes está na base do que é hoje a chamada informação quântica, campo com amplas aplicações neste início do século, entre elas a de computadores extremamente velozes. Ou seja, a filosofia virou tecnologia promissora.
Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje/RJ
Texto publicado na CH 268 (março/2010)