A mente do físico teórico suíço Walter Baltensperger foi treinada para resolver problemas. Lá, está o entendimento de equações, símbolos, números, fenômenos etc. O objetivo é destrinchar os enigmas, os mistérios da natureza. Foi com esse arsenal que ele fez trabalhos importantes na área de estado sólido (mais modernamente, matéria condensada).
De seu currículo respeitável, poderíamos aqui desfilar vários aspectos. Mas apenas tópicos daquelas várias folhas impressionariam qualquer físico: fez seu mestrado na Suíça com o prêmio Nobel de Física de 1945, Wolfgang Pauli (1900-1958); seu doutorado na Inglaterra com o físico belga Léon Rosenfeld (1904-1974); tornou-se professor da prestigiosa Escola Politécnica de Zurique, onde, em 1900, Albert Einstein (1879-1955) se formou.
Recém-doutorado, Baltensperger escolheu o Brasil. “Era simplesmente vontade de vir viver aqui, de pisar em terra roxa, conviver com as pessoas daqui. Não conhecia muito sobre o país. Acho que se tratava de uma afinidade subconsciente e de uma vontade de conhecer uma vida diferente”.
Baltensperger chegou aqui em 24 de agosto de 1954, dia em que Getúlio Vargas, então presidente do Brasil, se suicidou. Conheceu os primeiros tempos do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, em São José dos Campos (SP), e lá conviveu com nomes importantes da física brasileira, como Israel Vargas e Paulus Aulus Pompéia (1911-1992).
Foi também naquela cidade que ele notou uma garota em uma festa na casa de amigos. O flerte virou namoro e acabou em casamento. Baltensperger e Igná estão casados desde 1957. Têm três filhos, Fábio (1958), Guido (1960) e Vera (1964) – esta última é carioca de nascimento.
Depois de sua estada de dois anos no Brasil, Baltensperger voltou à Politécnica de Zurique – hoje, mais conhecida pela sigla ETHZ – para trabalhar como assistente de Georg Busch (1908-2000).
Em 1962, passou um ano como professor visitante na Universidade Brown (Estados Unidos) e, no ano seguinte, voltou ao Brasil, dessa vez para o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio de Janeiro (RJ), onde ficou cerca de um ano e meio.
Em 1965, foi nomeado professor associado no Instituto de Física Teórica na ETHZ e, em 1972, promovido a professor titular. Lá, de 1984 até 1991, presidiu a comissão que avalia todos os projetos de pesquisas naquela instituição.
Em 1993, aposentou-se na ETHZ e, desde então, é professor visitante no CBPF, onde, desde 1997, é pesquisador emérito. Baltensperger deixou aqui seu vasto conhecimento e a formação de alunos – foi orientador do primeiro mestrado formal em física no Brasil, defendido em 1965, pelo físico teórico argentino Jorge Helman (1940-1997), no CBPF.
Todo ano, passa sete ou oito meses trabalhando no CBPF e o restante na Suíça. Do frio dos Alpes para o calor dos trópicos.
Fale-nos um pouco sobre a origem de sua família.
Meu pai era ourives e herdou uma loja fundada pelo pai dele, em 1877, em uma cidadezinha perto de Zurique, pouco além do local onde hoje é o aeroporto. Por sinal, naquele lugar, o nome Baltensperger aparece já a partir do século 14. Eram fazendeiros, entre outras profissões. Meu pai herdou essa loja junto com um irmão dele, em 1908. Mais tarde, ele a dirigiu sozinho, pois o ir¬mão foi para Paris, para ser pintor. Meu pai teve sucesso na ourivesaria, pois conseguiu imprimir alta qualidade às peças. Morreu de repente, do coração, em fevereiro de 1931, quando eu tinha três anos e meio.
Minha mãe [Nelly, cujo nome de solteira era Koenig] veio de uma família de Berna [Suíça]. O pai dela era agente de seguros, principalmente para fazendei¬ros. A avó por parte da mãe era da parte italiana da Suíça, e minha mãe falava fluentemente em italiano com ela.
Tenho uma irmã dois anos mais velha, que vive em Zurique. Ela fez uma carreira comercial. O marido li¬dava com construções, manutenção de imóveis, coisas assim. Mais tarde, se divorciaram, e ela, sozinha, montou um negócio parecido.
Como foram seus primeiros anos na es¬cola? O senhor teve o incentivo de algum professor para enveredar pela física e matemática?
Ingressei na escola em 1934. Tinha sete anos e, como a minha irmã era mais velha, eu já sabia ler quando entrei na escola. Meus primeiros seis anos de escola primária foram em Zurique, na escola pública, que é a melhor na Suíça. A professora tinha bastante caráter, mas nada que pudesse me inspirar. Recebemos um ensino bom.
Depois fiz seis anos e meio no ginásio. Naquela época, conseguir entrar no ginásio não era fácil. Da minha classe, entraram cinco alunos, o que era muito, porque normalmente entravam dois. Era raro estudar na Suíça. Aprendi latim, a disciplina com maior carga horária, bem como francês e inglês. Grego era apenas para os que seguiam as humanidades.
Alberto Passos Guimarães
Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF)
Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje/ RJ
Colaborou Bruna Ventura (Ciência Hoje/ RJ)