Lições do Catarina e do Katrina – As mudanças do clima e os fenômenos extremos

 
Nos últimos tempos, fenômenos climáticos de grande poder de destruição vêm ocorrendo em diversas partes do mundo, causando enormes danos materiais e alto número de mortes. Nem o Brasil escapou: o Catarina, primeiro furacão do Atlântico Sul, pegou de surpresa moradores do sul do país em março do ano passado.
 
Alguns estudos indicam que o aumento da temperatura das águas oceânicas estaria tornando mais intensos esses fenômenos, mas ainda há incertezas quanto à real influência do chamado aquecimento global em mudanças na freqüência de furacões e tufões e em sua ocorrência em locais onde não eram observados. Centros de pesquisa de vários países, usando modelos climáticos, tentam prever se esses eventos extremos tendem a aumentar, para evitar ou amenizar tragédias como a provocada pelo furacão Katrina em Nova Orleans, nos Estados Unidos.
 
Existem evidências de que, em diversas regiões da Terra, estão aumentando a freqüência e a intensidade de fenômenos climáticos extremos. Ainda que esse aumento possa, em princípio, ser parte de uma variabilidade natural do clima, ele também é consistente com as conseqüências esperadas do aquecimento global – o aumento das temperaturas médias da superfície dos continentes e dos mares induzido por causas naturais e pelos efeitos de atividades humanas. Essa relação é preocupante, pois mostra que, em razão do aquecimento global (em especial o das águas do mar), a humanidade precisa estar preparada para enfrentar fenômenos climáticos cada vez mais severos.
 
Esses fenômenos já vêm acontecendo, como revelam notícias vindas de várias partes do mundo, causando imensos prejuízos materiais e causando a morte de grande número de pessoas. No entanto, os danos a cidades e populações provocados por ciclones, furacões, tufões e tempestades severas têm razões menos climáticas e mais demográficas e políticas.
 
Grandes cidades já foram atingidas por tempestades muito fortes no passado, sem tantas mortes ou estragos. A diferença é que de lá para cá ocorreu uma explosão demográfica nas zonas costeiras e muitas áreas sujeitas à passagem de furacões e chuvas fortes foram intensamente ocupadas, com o consentimento dos governos e sem maior preocupação com os riscos associados.
 

Imagem do Catarina, primeiro furacão conhecido no Atlântico Sul, que atingiu o sul do Brasil em 2004 – a fotografia, em cores naturais, foi obtida pelo satélite Terra (foto: Nasa)

Mesmo o Brasil não está imune a esses fenômenos. Em 27 de março de 2004 uma tempestade inicialmente classificada como ciclone extratropical atingiu a costa sul do Brasil, entre Laguna (SC) e Torres (RS), com chuvas fortes e ventos estimados em cerca de 150 km/h, matando 11 pessoas no continente e no oceano e causando destruição em dezenas de municípios. Após estudos e debates, concluiu-se que o fenômeno – batizado de Catarina por causa do estado mais atingido – foi o primeiro furacão de que se tem notícia no país.

 
O Catarina gerou muitas indagações sobre suas causas, e não está excluída a possibilidade de estar relacionado ao aquecimento global. Na verdade, ainda existe incerteza nos meios científicos sobre as possíveis conseqüências das mudanças climáticas associadas ao aquecimento global no aumento na freqüência e intensidade de furacões.
 
O que se sabe é que o aquecimento global é real e decorre principalmente, entre outros fatores, do aumento da concentração de gases de ‘efeito estufa’ na atmosfera. Essa maior concentração, gerada em grande parte pela queima de combustíveis derivados do petróleo e por desmatamentos, queimadas e incêndios florestais, acumulam-se na atmosfera e aumentam a retenção de calor pelo planeta, fazendo com que a baixa atmosfera se comporte como uma imensa estufa.
 
Para avaliar os efeitos desse aquecimento no clima, os países integrantes das Nações Unidas criaram em 1988 o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). Existe no Painel o consenso de que as mudanças do clima vinculadas ao aquecimento global podem alterar as trajetórias das tempestades severas (entre elas tempestades tropicais e furacões) e de que regiões que raramente experimentam fenômenos extremos hoje podem ser afetadas por eles no futuro. A pergunta que se faz é: esse futuro já chegou?

José A. Marengo e Carlos A. Nobre
Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos,
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.

 

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