Mecânica estatística, caos e complexidade

Por milhares de anos, o homem, ao observar planetas, satélites e estrelas, enxergou um cosmo regido pela ordem. No entanto, no final do século 19, a ciência se defrontou com os chamados sistemas caóticos, cujo comportamento é marcado pela imprevisibilidade. Para estudá-los, criou e adaptou ferramentas teóricas e experimentais.
 
Há poucas décadas, porém, uma nova classe de fenômenos reunidos sob o manto da chamada complexidade despertou a atenção da comunidade científica, principalmente por se manifestar em áreas tão díspares quanto a física, biologia, lingüística, economia e antropologia, por exemplo. Nos últimos 30 anos, a pesquisa em sistemas complexos ganhou fôlego. Tendo o computador como principal ferramenta, ela se tornou um dos campos mais interdisciplinares deste início de século.
 
A Revolução Industrial, iniciada na Europa do século 18 e que substituiu o esforço braçal humano e a tração animal pelas máquinas a vapor, foi acompanhada do desenvolvimento de uma nova linha de investigação científica diretamente ligada aos interesses econômicos da época: a termodinâmica. Esse ramo da física trata dos sistemas macroscópicos, que, por sua vez, são formados por muitas partículas minúsculas.
 
O exemplo típico de um sistema assim é o vapor confinado em uma caldeira de locomotiva. O calor fornecido pelo combustível – aqui, para nosso propósitos, podemos pensar em carvão – aumenta a velocidade – e, por sua vez, a energia cinética – das partículas que formam o vapor, tornando o movimento delas ainda mais agitado e, conseqüentemente, aumentando a temperatura do vapor. Essas partículas, então, colidem mais fortemente contra as paredes da caldeira, empurrando uma delas – o êmbolo móvel – para fora. Expandido, o vapor esfria novamente, e o êmbolo é forçado a voltar à posição original. O ciclo se repete, de forma que o movimento de vai-e-vem é aproveitado para girar o eixo assimétrico da roda.
 
Estratégia reducionista
Uma vã tentativa de estudar esse ciclo do ponto de vista microscópico seria aplicar as leis idealizadas pelo físico e matemático inglês Isaac Newton (1642-1727) a cada uma das minúsculas partículas componentes do vapor e, assim, determinar seus movimentos. Através desse ponto de vista, a termodinâmica seria apenas uma conseqüência das leis da mecânica. Essa é a estratégia reducionista, ou seja, dividir o sistema em partes menores, estudar cada parte dele separadamente e, depois, superpor os resultados parciais na tentativa de se obter o comportamento global. O todo seria simplesmente a superposição das partes.
 

Infelizmente, nesse caso, a estratégia não funciona. Sem contar o fato de não se conhecerem diretamente as forças de interação entre essas partículas quando elas colidem entre si ou contra as paredes da caldeira, há um problema adicional intransponível: estaremos lidando com um número astronômico delas (10 24 ) – o número 1 seguido de 24 zeros! –, o que torna inviável qualquer tentativa de solução das equações de movimento de Newton, pois teríamos que escrever uma equação para cada partícula, com a agravante de que a solução de uma dependerá do resultado das outras. Sem dúvida, tarefa sobre-humana..

Paulo Murilo Castro de Oliveira
Instituto de Física,
Universidade Federal Fluminense.

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