O desenvolvimento da espécie humana ocorre de forma muito diferenciada entre os gêneros, dadas as suas diferenças anatômicas, bioquímicas e fisiológicas. Homens e mulheres não envelhecem da mesma maneira. Na mulher, o organismo desenvolveu uma estratégia de interrupção reprodutiva, que a leva a viver mais de um terço de sua vida na condição de infertilidade – a chamada menopausa.
A palavra tem origem grega (mens=mês e pausis=parada). Mas, segundo alguns autores, como os sociólogos britânicos Mike Hepworth e Mike Featherstone, essa denominação foi adotada por médicos franceses a partir do século 18. Antes disso, essa condição era conhecida popularmente por ‘período de mudança de vida’. Na espécie humana, a menopausa é universal.
Teorias evolucionárias
Há relatos sobre a menopausa já na Grécia Antiga – é mencionada, por exemplo, em textos de Aristóteles (384-322 a.C.). Essa fase de vida da mulher – seus sintomas e danos, principalmente cerebrais, bem como a sua origem – é bastante investigada, mas, ao mesmo tempo, pouco compreendida.
A maioria dos animais se reproduz até a morte. Na espécie humana, entretanto, ocorre essa interrupção: as fêmeas podem sobreviver por muito tempo depois de cessar a fase reprodutiva, e esse longo período de vida pós-menopausa distingue os humanos de outros primatas.
O significado adaptativo da menopausa em mulheres de meia-idade há muito tempo tem chamado a atenção dos antropólogos evolutivos. Esses pesquisadores vêm questionando os motivos pelos quais a natureza desenvolveu essa estratégia não reprodutiva tão precocemente para as mulheres, uma vez que a interrupção da menstruação costuma ocorrer por volta da metade de suas vidas.
Existem algumas teorias que tentam explicar esse longo período de infertilidade. Uma delas, a teoria da avó – sustentada pela antropóloga britânica Ruth Mace, a norte-americana Kristen Hawkes e pela psicóloga norte-americana Barry Kuhle –, sugere que a menopausa teria surgido evolutivamente para evitar ‘competir’ em termos reprodutivos com a geração seguinte. As adversidades ambientais, marcadas pela escassez de alimentos, teriam feito com que as mulheres mais novas preferissem apostar em seus próprios filhos, que carregavam seus genes, do que ajudar as mulheres mais velhas a criarem os seus. Esse comportamento, com o passar do tempo, teria levado as avós a perderem a capacidade de procriar em favor de gerações mais novas.
Segundo a teoria da avó, a seleção natural teria beneficiado as crias das mulheres mais novas, que tinham mais chance de sobreviver e de serem cuidadas, pois, se as mulheres de meia-idade ancestrais engravidassem na mesma época em que suas filhas ou noras, elas enfrentariam maiores riscos de morte na gravidez e na infância de seus filhos do que as mulheres mais jovens. Outro resultado evolutivo dessa teoria é permitir que as avós, com mais conhecimentos sobre as adversidades da vida, se dediquem aos seus netos, protegendo-os. Assim, as mulheres maduras, auxiliando a criar os filhos de seus filhos, cuidariam da sobrevivência da família.
A teoria da avó é muito criticada por alguns pesquisadores. A finlandesa Mirkka Lahdenperä e colegas publicaram, em 2011, artigo em que defendem que, embora as mães sejam obrigadas a garantir a sobrevivência da prole, a perda materna poderia ser compensada por outros membros da família. Os autores sugerem ainda que os efeitos maternos na prole dependente não são suficientes para explicar a manutenção da menopausa ou a vida útil pós-reprodutiva prolongada na mulher. Os pesquisadores argumentam que o período não reprodutivo pode ser um fenômeno potencialmente adaptativo, porque o investimento em uma nova concepção na maturidade poderia arriscar a própria sobrevivência.
O biólogo canadense Richard A. Morton e colegas também criticaram a teoria da avó em artigo de 2013, na PloS Computational Biology. Eles sugerem que, em vez de a idade levar à infertilidade, seriam os homens os responsáveis pela menopausa – ou seja, a preferência masculina pelas mulheres mais jovens teria levado à falta de acasalamento e reprodução nas mulheres maduras, provocando mutações genéticas que resultariam na menopausa. Segundo esse grupo de pesquisadores, se não houvesse uma preferência dos homens pelas mulheres mais jovens, as mulheres maduras se reproduziriam como os homens, por toda a vida.
Alguns cientistas também discordam dessa última teoria, destacando que outros primatas que passam pelo fenômeno da menopausa têm uma vida curta após o surgimento da fase não reprodutiva. Por que a primata fêmea não vive por um longo período após a fase reprodutiva, como as mulheres? Segundo esses pesquisadores, a interrupção da vida reprodutiva em primatas superiores sempre chegou antes do término do tempo de vida, e os avanços da sociedade moderna seriam os responsáveis por mulheres viverem mais tempo após a menopausa. Mas isso não explica, por exemplo, por que os homens continuam férteis por toda a vida.
Enfim, o quebra-cabeça das razões evolucionárias para explicar por que as mulheres têm uma vida pós-reprodutiva tão longa continua a ser estudado e debatido.
Mecanismos cerebrais
Devido ao aumento da expectativa de vida e ao período constante em que as mulheres entram na menopausa, estima-se que elas vão passar mais de três décadas de suas vidas no período pós-reprodutivo. Assim, a saúde e o bem-estar dessas mulheres passaram a se tornar um problema de saúde pública em todo o mundo, razão pela qual tem crescido o número de estudos que buscam entender a neurobiologia da menopausa e os mecanismos envolvidos.
Apesar de a menopausa ser um processo biológico natural na espécie humana, que ocorre pela redução da secreção de hormônios ovarianos, principalmente o estrógeno, essa condição fisiológica pode ser um fator de risco para a saúde feminina, uma vez que o estradiol, o mais abundante e potente dos estrógenos, tem ações não reprodutivas em diversos sistemas fisiológicos, incluindo efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios. Evidências acumuladas ao longo dos últimos 25 anos mostram que o estradiol afeta processos como a diferenciação sexual, o humor e a memória em animais e humanos. Com a menopausa, os níveis de estrógenos circulantes despencam, e isso faz com que algumas mulheres sintam que seus cérebros não estão cooperando com a formação de suas memórias, incluindo as memórias espacial e verbal.
Nesse contexto, foi estabelecido recentemente que o estradiol pode agir em receptores da membrana das células para ativar mecanismos de sinalização intracelulares que alteram a função celular em regiões cerebrais importantes envolvidas nos mecanismos de memória, como o hipocampo. Outro fato interessante foi a descoberta de que os hormônios sexuais são neuroesteroides, isto é, tanto os estrogênios quanto os androgênios podem ser sintetizados em áreas do cérebro e, assim, rapidamente alterar a cognição e outras funções neurais.
As funções fisiológicas e as implicações desse mecanismo de ação dos estrógenos são ainda pouco conhecidas, mas constituem uma nova área de investigação. Assim, o estradiol, em particular, tem um rico repertório de possíveis mecanismos que podem influenciar a cognição.
Angela Wyse
Departamento de Bioquímica,
Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS),
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)