“Acho que ele, hoje, é o brasileiro de maior renome na matemática mundial”, diz, ao telefone, Maria Laura Mouzinho Leite Lopes, pioneira da matemática no Brasil, ao saber que a Ciência Hoje quer fazer o perfil de seu colega Paulo Ribenboim.
A leitura (mesmo enviesada) do currículo de Ribenboim sustenta a afirmação de sua colega de décadas. Cerca de 200 artigos publicados e 15 livros. É professor emérito da Universidade Queen’s (Canadá), membro da Royal Society daquele país, Doutor Honoris Causa pela Universidade de Caen (França) e ganhador de prêmios de prestígio, como o George Pólya em exposição matemática, por um artigo sobre números primos.
A Associação Canadense de Teoria dos Números criou o prêmio Paulo Ribenboim, dado, a cada dois anos, a jovens matemáticos. É o único brasileiro com verbete biográfico na respeitada página de história da matemática da internet, o arquivo The MacTutor de História da Matemática, da Universidade Saint Andrews (Escócia). Ribenboim é um especialista de fama internacional em teoria dos números, e seus alunos são hoje renomados matemáticos, em vários países.
Não há ‘se’ em história. Mas os fatos do parágrafo acima poderiam ter sido outros, caso o recifense Ribenboim, nascido em 13 de março de 1928, tivesse recebido resposta para as (várias) cartas enviadas a amigos do Brasil no início da década de 1960. À época, em Illinois (EUA), aquele jovem matemático – com mulher, dois filhos e contas a pagar – enfrentava o fim de uma prestigiosa bolsa Fulbright e de um visto de permanência nos EUA.
Zero = número de respostas às cartas, nas quais Ribenboim sondava uma posição no Brasil. Um colega o aconselhou a buscar algo no Canadá. Veio o convite da Queen’s, que ele aceitou. E tantos outros, que teve que declinar.
Nancy (França), 1951. Pela primeira vez na vida, Huguette Demangelle, jovem (e belíssima) aluna de um colégio católico da cidade, saía sozinha. Missão: comprar xampu para a irmã mais velha. Ribenboim a viu na fila da farmácia, entabulou conversa, esperou-a na saída e lhe pediu o telefone. Huguette cedeu.
Ribenboim ligou. E a mãe da jovem, ao atender, autorizou a filha, ultratímida, a conversar com o rapaz. Saírem sozinhos? Nem pensar. Ribenboim teve que ir à casa da moçoila. O único obstáculo a um relacionamento parecia o cachorro da família, que teimava em ser antipático com o pretendente. Ribenboim reclamou da fera, e a mãe – talvez, julgando que um genro seria melhor que o contumaz mordedor de estranhos – acabou doando o cão.
Em menos de um ano, Ribenboim, judeu, e Huguette, católica, se casariam em uma igreja em Nancy e viriam para o Brasil. Ano passado, em 19 de dezembro, o casal completou 60 anos de casamento. Eles têm dois filhos, Serge, de 1953, e Eric, 1961. São cinco netos. “Alguns muito bons em matemática”, diz o avô, orgulhoso.
No momento, Ribenboim trabalha com afinco para terminar um livro (cerca de 600 páginas) sobre tema complexo (espaços ultramétricos). Todos os dias, são três horas de trabalho corrido e breve pausa para descanso – quando ele está no Brasil, onde passa alguns meses todos os anos, tem predileção pelos jogos na TV de seu time, o Fluminense.
Seu último pedido na edição final deste perfil, lida para ele, por causa de sua pouca visão: “Por favor, retirem, com minha autorização, qualquer trecho em que eu possa ter soado arrogante.” Nele, modéstia soma-se à simpatia e à fineza extremas.
O Brasil não poderia estar mais bem representado na matemática mundial; e, raramente, os números têm encontrado amigo tão fiel como Paulo – assim ele gosta de ser chamado.
Antonio Augusto Passos Videira
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje/RJ
Colaborou Saulo Pereira Guimarães
Especial para a Ciência Hoje