O sítio arqueológico da cidade de Calçoene, no interior do Amapá, pode ter sido um grande calendário solar construído por civilizações antigas há mais de mil anos. A afirmação é do físico Marcomede Rangel, do Observatório Nacional, no Rio de Janeiro, que vem estudando o local. Descoberto pelo naturalista Emilio Goeldi (1859-1917) no início do século passado, o sítio abriga pedras monolíticas estrategicamente posicionadas no solo.
Com ajuda de estudantes do curso de turismo do Centro de Educação Profissional do Amapá (Cepa), o físico mapeou o local e descobriu uma relação entre o sítio e o fenômeno natural do equinócio. “Uma das pedras é uma chapa de granito de 3 m com uma abertura no centro com cerca de um palmo de diâmetro. Há outra pedra direcionada justamente em relação a essa. Provavelmente, o sítio era usado pelos povos antigos para saber a época de plantio, colheita, chuva e seca”, diz.
O equinócio acontece quando o Sol, visto da Terra, se desloca sobre a linha do Equador, nascendo a leste e se pondo a oeste. Essa passagem de um hemisfério a outro determina o início das estações primavera e outono, conforme o hemisfério. Durante o fenômeno, o dia e a noite têm a mesma duração.
Para Marcomede, os monumentos encontrados em Calçoene – comparáveis a Stonehenge, na Inglaterra, o mais conhecido círculo de pedras do mundo –, podem ter sido formas de homenagem aos deuses pagãos ou mesmo observatórios primitivos. “Já conseguimos saber que a luz do Sol é projetada pela abertura de uma das pedras, criando uma bola de luz, que vai bater em outra pedra. A bola de luz se desloca seguindo a linha do Equador”, conta o pesquisador.
O sítio de Calçoene ficou no esquecimento durante muito tempo. Somente em 2005, o ‘Stonehenge brasileiro’ despertou o interesse do governo do Amapá, quando foi catalogado e cercado, sendo estudado por arqueólogos do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (Iepa).
Pesquisas apontaram uma relação das construções com o solstício de inverno, momento em que o Sol está mais afastado do Equador, em cima do trópico de Capricórnio. Marcomede espera encontrar novos elos entre o sítio e fenômenos astronômicos: “Com os dados obtidos, confeccionaremos um mapa das constelações para encontrar outras relações com estrelas brilhantes e a Lua”, finaliza o físico.
Bruna Ventura
Ciência Hoje/RJ
Texto publicado na CH 268 (março/2010)