Em artigo publicado na revista Nature (30/06/2005, pp.1187-1190), cientistas abrem um debate importante – e considerado, por muitos, alarmante – sobre as incertezas nas estimativas atuais das mudanças climáticas globais. As partículas de aerossóis presentes na atmosfera – que, nas projeções do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em seu primeiro relatório, em 1990, apareciam como um ‘personagem’ secundário no cenário das mudanças climáticas – crescem em importância. Não por terem tido seus efeitos climáticos quantificados com confiança, mas, ao contrário, pelos fortes indícios de que as lacunas ainda existentes no conhecimento desses efeitos sejam uma das principais fontes nas altas incertezas das projeções climáticas que prevêem o aquecimento da Terra nas próximas décadas.
Cidade de Ji-Paraná (Rondônia) em duas situações: em um dia com céu limpo (no alto) e com a atmosfera carregada de aerossóis de fumaça que bloqueiam a radiação solar. A seta indica a posição do Sol (fotos: M. O. Andreae)
Até recentemente, o conhecimento sobre as partículas de aerossol atmosférico (sulfatos, orgânicos, poeira, aerossol marinho, fuligem etc.) não era suficiente para avaliações conclusivas sobre seus efeitos climáticos. Aerossóis têm um tempo de vida curto na atmosfera, da ordem de dias, se comparados com os gases de efeito estufa, que podem permanecer lá por décadas. Assim, os efeitos dos aerossóis no clima e mesmo no tempo atmosférico foram colocados em segundo plano. Entretanto, estudos realizados nos últimos anos apontam conclusivamente para um cenário muito mais complexo no qual os aerossóis têm um impacto potencialmente importante, ainda que permaneçam altas as incertezas associadas à quantificação de seus efeitos.
Em um comentário na mesma edição da revista, o correspondente da Nature aponta que, para uma atenuação da radiação pelo aerossol de 1,5 watt por metro quadrado – número considerado conservador pela comunidade científica –, a previsão de aquecimento para 2100 é de 6 o a 10 o C, enquanto as estimativas do IPCC são de um aquecimento global entre 1,4 o e 5,8 o C para o mesmo período. Ou seja, esses novos estudos prevêem um futuro, na melhor das hipóteses, concordante com as previsões atuais mais pessimistas!
Karla Maria Longo
Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos,
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (SP)