Há milênios, várias civilizações construíram uma ampla cultura mitológica, para explicar a origem do mundo e o funcionamento do universo. Deuses e seres sobrenaturais seriam os responsáveis pelos fenômenos da natureza, como a luz do Sol, a de um raio ou a chama de uma fogueira. Além desse patrimônio cultural e religioso, o ser humano construiu outras formas de explicar a natureza, como a filosofia e a ciência moderna.
O pensamento filosófico ocidental surgiu na Grécia, por volta do século 6 a.C. Nesse contexto, as primeiras teorias filosóficas para explicar a luz variavam segundo as escolas de pensamento, formadas por pensadores que compartilhavam visões semelhantes sobre o funcionamento do mundo.
O filósofo Leucipo de Mileto (c. 500 a.C.) acreditava que os objetos emitiam pequenas partículas – como se fossem películas que se desprendiam de sua superfície – que chegavam a nossos olhos, ocasionando a visão. Essas películas – denominadas eidola (plural de eidolun) – carregavam informações, como a cor e a forma dos objetos. A luz, portanto, seria essa emanação material, transmitida dos objetos visíveis para o olho do observador, e a sensação visual seria causada pelo contato direto das eidola com o órgão dos sentidos.
Leucipo era adepto do atomismo e foi um dos representantes mais conhecidos dessa escola de pensamento, como Demócrito (c. 460-370 a.C.), Epicuro (c. 341-270 a.C.) e Lucrécio (c. 98-55 a.C.). Sua explicação para a luz estava vinculada à sua concepção de funcionamento do universo: o mundo era formado por átomos (minúsculas partículas eternas e indivisíveis), que se movimentavam no espaço vazio em todas as direções e se combinavam ‘ao acaso’, formando toda a matéria conhecida.
A teoria atomista deixava questões sem resposta: como as eidola passam umas pelas outras sem se chocarem ou interagirem? Se eram formadas por átomos, por que não se combinavam formando uma imagem confusa? Como as eidola de uma montanha encolhem suficientemente para caber nos olhos? Por que os objetos distantes parecem menores?
Algo imaterial
Empédocles de Agrigento (493-430 a.C.) acreditava que o universo era formado por quatro elementos básicos, associados a quatro divindades: fogo (Zeus), ar (Hera), terra (Hades) e água (Nestis), que se misturavam em diferentes proporções, formando tudo que existia.
A luz estava relacionada ao elemento fogo: nossos olhos emitiriam um raio visual, uma espécie de fogo interno que tocava os objetos e trazia informações sobre eles. Seria como se o ato de enxergar fosse semelhante ao tato: um ‘tentáculo de luz’ emanaria dos olhos, interagindo com o fogo que os objetos também emitiriam, carregando suas informações, como cor e forma. Alguns filósofos questionavam: se a visão dependia do fogo luminoso emitido pelos olhos e da emanação dos objetos, por que não era possível enxergar no escuro?
Aristóteles (384-322 a.C.) não aceitava a ideia de vazio, diferentemente dos atomistas. Para ele, todo o universo seria preenchido por matéria. O mundo terrestre seria todo formado pelos quatro elementos, água, terra, fogo e ar. No mundo celeste, todos os corpos seriam feitos pelo quinto elemento, o éter, a chamada quintessência. Assim, a luz não poderia ser algo material, pois dois corpos (no caso, os quatro elementos e a luz) não poderiam ocupar o mesmo lugar no espaço.
Para o pensador grego, a luz seria uma propriedade intrínseca – portanto, imaterial – dos meios transparentes. Por exemplo, o Sol e outras fontes luminosas produziriam uma espécie de alteração no meio transparente ao redor deles, permitindo, assim, a visão dos objetos. Estes, por sua vez, também produziriam mudanças no meio em que estivessem imersos e, na presença de luz solar, transmitiriam instantaneamente essa alteração para os olhos do observador.
Vibrações do éter
Várias teorias para a luz surgiram entre a Antiguidade Clássica e a Idade Média. Nesse período, ocorreu um desenvolvimento bastante significativo da óptica, com a contribuição de diversos povos.
Até meados do século 17, havia muitas explicações para a natureza da luz. Suas propriedades geométricas já eram conhecidas: os raios de luz se propagam em linha reta; os ângulos de incidência e reflexão são iguais; a refração obedece à lei dos senos (hoje chamada de lei de Snell-Descartes).
Mas uma coisa é descrever o comportamento da luz; outra, explicar o que é a luz…
O filósofo natural holandês Christiaan Huygens (1629-1695), conhecido por suas contribuições à física e à astronomia, construiu sua teoria inspirado em uma analogia: o som seria uma vibração que se propaga em um meio invisível, como o ar; a luz seria uma vibração no éter, uma matéria tão leve e rarefeita que não atrapalhava o movimento dos objetos e que os sentidos humanos não poderiam captar.
A luz era produzida por partículas existentes no fogo, cujo movimento muito rápido produzia vibrações que se propagavam no éter, que preenchia todos os espaços vazios do universo. Os raios de luz provinham de uma infinidade de lugares e se cruzavam sem que uns atrapalhassem os outros. As vibrações nasceriam do movimento de cada ponto do objeto luminoso – caso contrário, não seria possível perceber todas as diferentes partes do objeto.
Thaís Cyrino de Mello Forato
Departamento de Ciências Exatas e da Terra
Universidade Federal de São Paulo (campus Diadema)