Concepção artística do satélite Firefly, que irá investigar os flashes terrestres de raios gama (imagem: USRA).

Um fenômeno majestoso que ocorre nas nuvens permanecia há vários anos envolto em uma aura de mistério. O esclarecimento da situação veio por meio do trabalho de pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco.

Sobre as nuvens de tempestades já foram descobertos inúmeros fenômenos luminosos. Mas, em 1994, astrônomos da Nasa (agência espacial norte-americana), por meio do Observatório Compton de Raios Gama, descobriram mais um fenômeno intrigante: os TGFs (do inglês, flashes terrestres de raios gama).

Os TGFs são pulsos muito breves (da ordem de milissegundos) de raios gama (a radiação mais energética do espectro eletromagnético), explicados, até então, como provenientes da colisão, contra moléculas de nitrogênio e oxigênio da atmosfera, de elétrons relativísticos (aqueles que viajam com velocidades próximas à da luz, ou seja, 300 mil km/s).

Esses choques geram uma avalanche de elétrons acelerados por campos elétricos remanescentes de intensos relâmpagos das nuvens de tempestade (ver ‘Eletricidade e poluição no ar: como as queimadas afetam as nuvens de tempestade e os relâmpagos’ em CH 252). A média diária desses eventos no planeta parece estar na casa dos 50, localizados entre 15 km e 20 km do solo.

Até aí, a ciência conhecia. Mas permanecia um mistério sondando esse fenômeno atmosférico. Qual a origem desse mecanismo de avalanche de elétrons? E como essas partículas atingiam velocidades iniciais tão altas, a ponto de desencadear a formação de raios gama no choque com as moléculas de ar?

A resposta veio das pesquisas de Gerson Paiva, Antonio Pavão e Cristiano Cordeiro, do Departamento de Química Fundamental da UFPE. O trio propôs que esses elétrons relativísticos têm origem na ‘decomposição’ (decaimento) de múons contidos nos raios cósmicos, essa ‘chuva’ de partículas provenientes do Sol e de regiões remotas do universo, que constantemente bombardeia a atmosfera terrestre.

Os múons (primos dos elétrons, com a mesma carga, porém mais pesados) seriam freados pelo campo elétrico remanescente dos relâmpagos de nuvens de tempestade, decaindo naturalmente em elétrons acelerados e seus respectivos neutrinos (partículas sem carga), que seguem em todas as direções. Os elétrons que se deslocam para cima formam os TGFs.

O estudo dos brasileiros, publicado em fevereiro no Journal of Geophysical Research, mostrou o mecanismo por completo dos TGFs, esclarecendo-o para a comunidade internacional.

Porém, há outros enigmas que rondam o fenômeno recém-descoberto. Para tentar entendê-los, está previsto, para o ano que vem, o lançamento do satélite Firefly, pela Nasa.

Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje / RJ

 

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