Estudo mostrou o caminho para a obtenção de uma nova geração de repelentes contra insetos, ao descobrir compostos com essa propriedade mais baratos, seguros para humanos e que não dissolvem o plástico. E, de quebra, o grupo responsável pela pesquisa ainda fez uma descoberta básica importante sobre a morfologia de insetos, considerada uma revolução na área que estuda o olfato.
Pode-se dizer que a equipe de Anandasankar Ray, da Universidade da Califórnia, em Riverside (EUA), iniciou o experimento pelo caminho inverso: primeiramente, identificou que neurônios eram responsáveis por fazer o inseto evitar um repelente. E essa estratégia levou à seleção de quatro substâncias que podem ser o ponto de partida para uma nova geração de repelentes contra insetos e, talvez, também pragas da agricultura.
Ray e colegas usaram a Drosophila melanogaster modificada geneticamente para que os neurônios olfativos dessas moscas-da-fruta brilhassem em verde fluorescente quando ativados pelo princípio ativo do mais comum dos repelentes atuais, o DEET – há cerca de 60 anos no mercado, o DEET (sigla para N, N-dietil-m-toluamida) é caro, faz mal à saúde de mamíferos – inibe a enzima acetilcolinesterase – e tem a desvantagem de dissolver plásticos.
Nas mosquinhas modificadas, os pesquisadores conseguiram localizar o receptor do DEET: a proteína Ir40a. Ela está nos neurônios olfativos de uma região da antena da Drosophila pouco estudada e conhecida, o sáculo, com forma de poço. Descoberto o receptor, a equipe selecionou, entre cerca de 400 mil substâncias, aproximadamente 200 candidatos ao posto de repelentes naturais. Quatro desses compostos ativaram os neurônios do sáculo e mantiveram afastados tanto a Drosophila quanto mosquitos Aedes. Ou seja, comportaram-se como repelentes. Ray e equipe publicaram os resultados em Nature (02/10/13).
Já aprovadas
A vantagem é que essas substâncias selecionadas são baratas, podem ser fabricadas em grandes quantidades e não têm efeitos colaterais para humanos e outros animais. Além disso, não dissolvem plásticos. Três delas são aprovadas pelo FDA (órgão que regula o comércio de drogas e alimentos nos EUA) como flavorizantes e são usadas em comidas.
E a parte mais peculiar da descoberta: as substâncias têm cheiro de uva.
Poderiam, então, ser aplicadas a mosquiteiros, cortinas e até roupas. A universidade já entrou com o pedido de duas patentes.
Segundo Ray, a proteína Ir40a está presente em muitos insetos e pragas. Assim, é possível que os repelentes recém-descobertos possam também servir para manter afastados piolhos, percevejos, formigas, baratas etc. E serem usados na agricultura para evitar a aproximação de pestes, bem como em áreas atingidas por doenças que são transmitidas por insetos, como dengue, malária, febre amarela.
Cássio Leite Vieira
Ciência Hoje/ RJ
Texto originalmente publicado na CH 309 (novembro de 2013).