Se alguém nos diz que Alberto é mais alto que Bruno, e que este é mais alto que Carlos, concluímos, sem grande esforço, que Alberto é mais alto que Carlos. “Nada poderia ser mais simples”, imagino o(a) leitor(a) dizendo isso para si mesmo(a). Essa propriedade, ilustrada no caso das alturas de nossas três personagens imaginárias, é chamada, em matemática, relação transitiva.
Vamos tentar entender o que é, do ponto de vista da matemática, uma relação. Exemplos úteis: maior (>), menor (<) ou igual (=) são relações transitivas. Vejamos no caso da igualdade: se A = B e B = C, então A = C. Na prática: se 4 = 2 + 2 e 2 + 2 = 3 + 1. Então, 4 = 3 +1.
Quando temos uma regra que funciona bem, é sempre interessante ver o que acontece se a mudarmos. Primeira pergunta: será que pode existir algum tipo de relação que não é transitiva? Segunda: se existir, ela é simples (e interessante) ou complicada (desinteressante)?
Bem, esse tipo de relação existe, e seu nome (meio óbvio, é verdade) é relação não transitiva. Certo, mas em que situações elas surgem? – garanto que o(a) leitor(a) até conhece um exemplo!
Pedra, papel ou tesoura. Lembra-se do jogo? E das regras?
São três elementos: pedra, papel e tesoura. A pedra (representada pelo punho fechado), papel (mão aberta) e tesoura (os dedos indicador e médio formam um V). Regras básicas: dado um sinal, cada um dos jogadores apresenta um elemento. Pedra perde para papel (o papel embrulha a pedra); papel perde para tesoura (esta corta o primeiro); e, finalmente, a tesoura perde para a pedra, que quebra aquela.
Nesse caso, a relação que introduzimos foi ganhar/perder. Se ela fosse transitiva, teríamos o seguinte: pedra perde para papel, papel perde para tesoura e, então, pedra deveria perder para tesoura. Mas não é isso o que acontece. A relação ganhar/perder não é transitiva.
Esse exemplo simples mostra que podemos criar uma situação real (e divertida) na qual uma relação não transitiva surge de forma natural.
Em tempo: há uma estratégia para vencer o jogo? Não. Mas a dica a seguir talvez ajude: por alguma razão, as pessoas parecem escolher pedra com mais frequência (mas a razão pertence ao campo da psicologia e não ao da matemática). Assim, se você for jogar com alguém que não tenha lido esta coluna, jogar papel é uma boa estratégia.
Suponha que um jogador jogue só pedra e papel, com iguais probabilidades. Há alguma estratégia para vencê-lo? Em outras palavras, se jogarmos muitas partidas, há algum modo de obtermos mais vitórias do que ele?
Marco Moriconi
Instituto de Física
Universidade Federal Fluminense