Os sons produzidos por um violino tocado com maestria encantam há séculos plateias de todo o mundo. Esses sons também vêm fascinando cientistas, e não só por sua beleza, mas também por suas características muito especiais. A acústica do violino é estudada por físicos há muito tempo, e continua a ser um desafio. O modo como os sons do instrumento são produzidos, pela vibração de cordas de aço friccionadas por fios de crina de cavalo, a transferência dos sons para uma caixa de ressonância que os altera e amplifica, a influência do tipo de madeira usado em cada peça do conjunto e outros aspectos dão ao violino uma complexidade que atrai o interesse de estudiosos e passa desapercebida aos ouvintes da boa música.
O violino é considerado o mais sofisticado dos instrumentos de cordas. É uma obra de arte refinada em suas linhas, de inspirada beleza plástica, e uma invenção de grande complexidade em termos acústicos. Faz parte de uma ‘família’ de instrumentos tradicionais que inclui ainda a viola e o violoncelo. O violino surgiu na Itália no começo do século 16, como uma evolução de instrumentos de cordas friccionadas como o rebec, a vielle e a lira da braccio, usados popularmente em festas com danças, segundo historiadores.
Os primeiros violinos foram criados por duas célebres escolas italianas de luteria, como é chamada a fabricação de instrumentos musicais de cordas e com caixa de ressonância: a escola de Brescia, com Gasparo Bertolotti, conhecido como Gasparo Da Salò (1540-1609), e a de Cremona, com Andrea Amati (c.1505-c.1578). Em Brescia, Giovanni Maggini (1580-1630) foi além dos passos de Da Salò, seu mestre, produzindo as formas atuais do violino e construindo os primeiros violoncelos. Em Cremona, a dinastia dos Amati atingiu sua supremacia com Nicola Amati (1596-1684), neto de Andrea Amati e mestre de Andrea Guarneri (1626-1698) e Antonio Stradivari (c.1644-1737). Outro renomado luthier foi Bartolomeo Giuseppe Guarneri (1698-1744), conhecido como ‘del Gesù’, neto de Andrea Guarneri.
Guarneri del Gesù e Antonio Stradivari são universalmente considerados os maiores fabricantes de instrumentos de corda de todos os tempos. Hoje, os instrumentos ainda existentes são altamente valorizados: em 2006, um comprador anônimo pagou US$ 3,5 milhões por um violino Stradivarius de 1707 leiloado na casa Christie’s, nos Estados Unidos. O fato de o violino praticamente não ter sofrido modificações nos últimos 250 anos ilustra o extraordinário nível artístico e tecnológico alcançado pelos luthiers italianos daquela época.
A compreensão da acústica do violino é um desafio até os dias de hoje. Os físicos sempre se sentiram cativados por esse instrumento. O alemão Albert Einstein (1879-1955), talvez o mais famoso físico do mundo, era violinista e participou de grupos de música de câmara em Berlim (Alemanha) e em Princeton (Estados Unidos). Muitos físicos contribuíram com pesquisas para a compreensão das propriedades físicas e acústicas do instrumento. Entre eles estão o francês Félix Savart (1791-1841), o alemão Hermann von Helmholtz (1821-1894), o norte-americano Frederick Saunders (1875-1963) e o indiano Chandrasekhara V. Raman (1888-1970).
As cordas e os sons
Um violino é constituído de um conjunto de quatro cordas de aço esticadas sobre uma caixa acústica. As quatro cordas estão afinadas em intervalos de quintas justas – o que significa sete semitons – e suas notas musicais e respectivas frequências são: Sol3 (196 hertz, ou ciclos por segundo), Ré4 (293,66 Hz), Lá4 (440 Hz) e Mi5 (659,26 Hz). O subíndice de cada nota indica a oitava correspondente na escala temperada. Denomina-se ‘oitava’ o intervalo em que a frequência de um som dobra (o Lá4 tem frequência de 440 Hz e o Lá5 de 880 Hz, por exemplo). A escala temperada é a escala musical com subdivisões (12 semitons em uma oitava) sempre iguais, utilizada na música atual.
As cordas são afinadas, na frequência das notas, ajustando-se sua tensão com microafinadores. A expressividade do violino é também atribuída à existência, nesse instrumento, de um timbre (ou seja, uma característica sonora) específico para cada uma de suas cordas. A mais aguda (Mi) é brilhante e incisiva; a segunda corda (Lá) sugere doçura e delicadeza; a terceira (Ré) tem uma sonoridade profunda, ressonante e melodiosa; e a quarta corda (Sol) é grave e imponente.
José Pedro Donoso*,
Francisco Guimarães
e Alberto Tannús
Instituto de Física de São Carlos,
Universidade de São Paulo
Thiago Corrêa de Freitas
Tecnologia em Construção de Instrumentos Musicais-Luteria
e Departamento de Física, Universidade Federal do Paraná
Deiviti Bruno*
Curso de Luteria, Conservatório Dramático e Musical de Tatuí (SP)
* J. P. Donoso e D. Bruno integram a Orquestra Experimental da Universidade Federal de São Carlos