A existência da vida requer um suprimento contínuo de energia. A todo instante, em nosso corpo, células trocam substâncias com o meio em que se encontram; neurônios emitem e recebem informações; nossos músculos nos auxiliam nos mais variados tipos de movimento; células se multiplicam; o sistema imune combate invasores; danos são reparados… Em cada um desses processos, há a realização de trabalho, que só ocorre à custa de fornecimento de energia. Entre as diferentes fontes de energia disponíveis no ambiente, os seres vivos utilizam a química e a luminosa. Cabe ressaltar que todo o nosso alimento, o combustível fóssil e o combustível biológico (biomassa) são resultantes da fotossíntese ocorrida tanto no passado quanto no presente.
Enquanto o termo fotossíntese significa literalmente a síntese ou construção pela luz, a fotossíntese é responsável pela transformação da energia eletromagnética (luminosa) em energia química. Na biosfera, há seis elementos que são denominados ‘ingredientes da vida’: hidrogênio, carbono, oxigênio, nitrogênio, fósforo e enxofre (H, C, O, N, P e S). Com exceção do fósforo, esses elementos são incorporados ao nosso organismo na forma reduzida, ou seja, na qual seus átomos receberam um ou mais elétrons. Quando isso ocorre, diz-se tecnicamente que os átomos sofreram uma redução. Quando o átomo perde um ou mais elétrons, ocorre a oxidação – a ferrugem, por exemplo, é um tipo bem comum de oxidação.
Em última análise, podemos pensar na fotossíntese como um processo que usa energia solar para fornecer os elétrons necessários para reduzir os elementos químicos que fazem parte de nossa lista de ‘ingredientes da vida’ e, assim, incorporá-los às moléculas essenciais ao nosso organismo, como proteínas, lipídeos (gorduras), polissacarídeos (açúcares) e ácidos nucleicos (RNA e DNA). Como os organismos que realizam fotossíntese (vegetais, macro e microalgas, cianobactérias e quatro famílias de bactérias) proporcionam matéria orgânica para todos os outros organismos de um ecossistema, eles são denominados ‘produtores primários’.
A atmosfera primitiva da Terra era ligeiramente redutora. Continha gás carbônico (CO2), nitrogênio (N3), vapor d’água e, possivelmente, monóxido de carbono (CO) em quantidades significativas. Provavelmente, havia também metano (CH4), ácido sulfídrico (H2S) e amônia (NH3), mas em quantidades bem pequenas, e, quase certamente, pouquíssimo oxigênio, resultante da decomposição do vapor de água pela radiação ultravioleta.
A oxigenação da atmosfera iniciou-se há aproximadamente 2,4 bilhões de anos por meio da fotossíntese realizada por cianobactérias que passaram a utilizar a água como fonte de elétrons para reduzir os ‘ingredientes da vida’. Nos dias de hoje, a fotossíntese oxigênica é responsável por mais de 99,8% da produção primária global em nosso planeta.
Atualmente, nossa atmosfera é transparente apenas a uma pequena fração da radiação eletromagnética emitida pelo Sol. Ao nível do mar, essa radiação corresponde a cerca de 9% na região do ultravioleta, a 51% na região do infravermelho (calor) e a 40% na região do visível. Esta última fração é a usada na fotossíntese e, por isso, denominada PAR (sigla, em inglês, para radiação fotossinteticamente ativa).
O uso da luz visível como fonte de energia requer a presença de pigmentos fotossinteticamente ativos, capazes de absorver luz, de transferir a energia absorvida e iniciar as reações envolvidas na fotossíntese, nas quais ocorre a transferência de elétrons, resultando na oxidação e na redução.
As três principais classes de pigmentos encontrados em vegetais, em macro e microalgas, bem como em cianobactérias, são as clorofilas, os carotenoides e as ficobilinas. Entre as diferentes espécies de clorofilas, a clorofila-a é a mais abundante de todas – evidências indicam que as outras clorofilas (b, c1, c2, d e clorofila-f) sejam derivadas da clorofila-a. Essa clorofila é encontrada tanto em estruturas cuja função é absorver luz (complexos antena) quanto nos centros de reação. Estes últimos são capazes de transformar a energia luminosa coletada pelos complexos antena em energia química, transformação que ocorre por meio de uma série de reações denominadas fotoquímicas.
O conjunto formado pelos complexos antena associados a um de centro de reação constitui uma unidade fotossintética, denominada fotossistema. Cabe ainda mencionar que a clorofila-a encontra-se presente em praticamente todos os organismos que realizam fotossíntese oxigênica, e que sua capacidade de absorção de luz no espectro do visível é alta na região do azul e do vermelho, e mínima na região do verde – por isso é verde. As demais clorofilas, bem como os carotenoides e as ficobilinas, absorvem em outras faixas do visível, aquelas em que a eficiência da absorção da clorofila-a não é tão alta – daí serem chamados pigmentos acessórios.
De modo simplificado, podemos descrever as duas etapas que ocorrem em um fotossistema: i) partículas de luz (fótons) são coletadas pelas moléculas de pigmento (clorofila-a e pigmentos acessórios) dos complexos antena; ii) a energia absorvida é transferida da antena para as moléculas de clorofila-a do centro de reação, onde um de seus elétrons será transferido para um aceptor – que sofrerá redução –, e o elétron perdido pela clorofila-a – que estará oxidada – será reposto por um doador.
Há 2,4 bilhões de anos, a grande ‘invenção’ das cianobactérias foi a utilização da água como fonte de elétrons para repor os que forem perdidos pela clorofila-a.
Ricardo Moreira Chaloub
Laboratório de Estudos Aplicados em Fotossíntese (LEAF),
Instituto de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro