Descobrir parentescos pode ser uma atividade tanto prazerosa quanto surpreendente. É provável que o leitor já tenha passado por algo do tipo “Mas, então, você é sobrinho da prima da mulher do Teobaldo! Ele é cunhado da sogra do meu avô!” Essas relações familiares podem ser claras para alguns, mas, para outros, deixam dúvidas como “será que somos primos de trigésimo grau?” ou “Então… sou meu próprio avô!” Brincadeiras à parte, a pergunta desta coluna é a seguinte: é possível provar que somos todos parentes?
Há um argumento muito simpático atribuído a Daniel Dennett. Esse filósofo norte-americano mostra matematicamente que existiu uma mulher (obviamente, há muitos e muitos anos) que é uma espécie de superavó de todos nós. É a chamada Eva mitocondrial.
Primeiramente, alguns fatos de biologia. Nas células, há uma organela chamada mitocôndria, que age como uma ‘fábrica’ de energia celular. No interior dela, há um material genético denominado DNA mitocondrial (mtDNA). Este é passado unicamente da mãe para a prole (filhos ou filhas). Portanto, para nossos propósitos aqui, basta saber que há algo que passa da mãe para os descendentes dela.
Vamos, agora, à matemática. Como isso pode nos ajudar a mostrar que somos, de fato, todos parentes? Considere todas as pessoas que estão vivas neste exato momento. Esse conjunto, que chamaremos P (de população), é grande, mas finito (tem menos de 7 bilhões de pessoas).
Um fato simples, mas útil: todo membro de P tem mãe. Antes de prosseguirmos, vamos dar uma ‘enxugada’ em P: manteremos nele, além de todos os homens, apenas as mulheres que são órfãs de mãe. Exemplo: se Ana é órfã de mãe e é mãe de Beatriz, que é mãe de Cláudia, então removemos Beatriz e Claudia, mas mantemos Ana no conjunto. Chamaremos esse P ‘enxugado’ de OH (de órfãs e homens).
Considere, agora, o conjunto M1, que reúne as mães dos membros de OH. M1 tem menos elementos que OH, pois toda pessoa em OH tem mãe, mas cada mãe em M1 pode ter mais de um(a) filho(a).
Agora, entra em cena o conjunto das mães das mulheres de M1. Esse conjunto (M2) é também menor que M1, por razões análogas ao que acabamos de discutir para M1 em relação a OH. Prosseguindo assim, podemos definir um conjunto M3, das mães das mulheres em M2. E assim por diante. E cada conjunto será menor que o anterior.
Seguindo esse raciocínio, chegaremos ao menor conjunto possível: com só um elemento! Eis aí a Eva mitocondrial, aquela que passou seu DNA mitocondrial para todos nós hoje. Portanto, leitor, você é parente deste colunista (Ah!, sim, prazer em conhecê-lo. Aliás… você conhece o tio Teobaldo?).
Observação pertinente: em princípio, poderíamos ter um grupo de mulheres filhas únicas, cujas mães são filhas únicas e assim por diante; nesse caso, não poderíamos aplicar o argumento de os conjuntos ficarem menores a cada passagem (aqui, estamos assumindo a hipótese de a probabilidade de isso acontecer ser praticamente nula).
Alerta: se um ‘primo’ distante aparecer, de repente, querendo passar uns dias na sua casa e alegando ser filho da ‘tia Eva’, olho vivo!
Desafio
A razão pela qual ‘enxugamos’ o conjunto P foi para evitar um (pequeno) problema técnico, o das ‘avós empilhadas’. Qual seria o problema se não tivéssemos enxugado P?
Solução do desafio passado
Iniciando com 3 mil bananas, Almacaque terá que fazer ida-volta-ida-volta-ida até o posto de abastecimento, consumindo cinco bananas por km, até que o total disponível sejam 2 mil. Isso se dá com um posto de abastecimento a 200 km de Bagdananah. Depois disso, Almacaque consumirá três bananas por km (como na solução da coluna passada) por 333,3 km. Quando ele se encontrar a 466,6 km de Dubaibuína, ele poderá carregar todas as 1 mil bananas restantes, entregando um total de 533,3 delas.
Marco Moriconi
Instituto de Física,
Universidade Federal Fluminense