O século 20 foi palco de diversas revoluções na física. Novas teorias mudaram radicalmente o que sabíamos sobre o universo, desde o mundo muito pequeno, com o nascimento da física quântica, até o muito grande, à luz da teoria da relatividade geral. Que essas revoluções ocorreram é um fato que já ultrapassou há muito tempo as paredes da academia, e faz parte da cultura geral, em livros de ficção científica, séries de TV, filmes. Não por acaso a série televisiva The Big Bang Theory é tão popular.
Mas, o que foram essas revoluções, exatamente? É possível explicar, em termos simples, a teoria da relatividade geral ou a física quântica? E quais são os problemas da física hoje, quais as grandes questões? Podemos explicá-las?
Neste pequeno volume, o físico teórico italiano Carlo Rovelli, especialista em gravidade quântica, mais especificamente em ‘gravitação quântica em laços’ (loop quantum gravity), apresenta sete breves lições sobre alguns desses tópicos revolucionários para aqueles que “não conhecem ou conhecem pouco a ciência moderna”.
As lições refletem, claramente, o gosto pessoal do autor, o que não é, de forma alguma, um defeito. Apresentam a relatividade geral – que descreve a gravitação como um efeito da curvatura do espaço-tempo –, a física quântica e o mundo microscópico, a arquitetura do cosmo e o Big Bang, as partículas que formam todas as coisas que existem, os grãos do espaço e a tentativa de unificar a relatividade geral e a mecânica quântica (área de especialidade de Rovelli), a probabilidade e os buracos negros – e a surpreendente conexão entre calor e a seta do tempo – e concluem com uma investigação sobre nós mesmos.
Apesar da lista ambiciosa, Rovelli apresenta os temas com leveza e uma prosa simples, frequentemente poética, e explica essas ideias de maneira acessível. Claro que, dadas as limitações de espaço, o que se leva é mais um sabor geral do que foi feito do que os detalhes técnicos – e não poderia ser diferente.
Além de comunicar essas grandes ideias a um público amplo, Rovelli contribui para diminuir a distância daquilo que foi chamado de “as duas culturas”, pelo cientista e novelista inglês C. P. Snow (1905 – 1980). Em uma palestra de 1959, Snow alertou para o fato de a vida intelectual da sociedade ocidental ter se dividido em duas cultutras – as ciências e as humanidades – e apontou que isso era um grande obstáculo para resolvermos os problemas do mundo. Snow considerava a ignorância da segunda lei da termodinâmica, por exemplo, uma falha tão grave quanto nunca ter lido as obras de Shakespeare.
E, talvez, uma das contribuições importantes do pequeno livro de Rovelli seja a de mostrar que existe uma beleza intrínseca em algumas teorias físicas, assim como nas “obras-primas absolutas, que nos emocionam intensamente”, como o Réquiem, de Mozart, a Capela Sistina, de Michelangelo, e Rei Lear, de Shakespeare. A esse sublime conjunto, Rovelli adiciona a teoria da relatividade geral.
Os ensaios são de leitura rápida; uma tarde tranquila será mais do que o tempo necessário para passear pelo mundo de ideias e pensar em algumas de suas consequências. Será, certamente, um passeio muito instrutivo. Por exemplo, da lição sobre a arquitetura do cosmo, se coloca a pergunta: ‘Havia algo antes?’. Não sabemos. Ao discutir calor e buracos negros, entendemos como um problema, a termodinâmica dos buracos negros, é uma “pedra de Roseta”, que une três ideias fundamentais – a gravitação, os quanta e a termodinâmica.
O livro finaliza com uma questão crucial, que todos nos fazemos em algum momento e que ainda estamos longe de responder: ‘O que somos?’. Sobre isso não há uma resposta contundente. Ainda. Mas Rovelli não é tão otimista com relação ao futuro da humanidade e acredita que “nossa espécie não durará muito”. Mesmo assim, ele tem fé no ser humano e celebra nossa busca pelo conhecimento, pois, diante de nós, no “oceano do desconhecido, reluzem o mistério e a beleza do mundo”.
Mas há uma oitava lição a ser tirada do livro de Rovelli, e que nos deve fazer refletir. Esses ensaios foram publicados no caderno de cultura dominical do jornal italiano Il Sole 24 Ore, o que mostra que os editores procuraram construir uma ponte entre as ciências e as humanidades. O livro foi um best-seller inesperado na Itália, e já foi traduzido para diversas línguas. Essa oitava lição nos mostra que o grande público, mesmo aquele que “não conhece ou conhece pouco a ciência moderna”, tem curiosidade em saber mais sobre as revoluções científicas e sobre as perguntas que ainda não sabemos responder. E, sobre essa nossa curiosidade em saber mais sobre o mundo, Rovelli acertou em cheio.
Marco Moriconi
Instituto de Física,
Universidade Federal Fluminense