Pergunta enviada por Paula Signor Testa, por correio eletrônico.
É pouco provável que haja qualquer interferência. O Programa de Pesquisa Ativa de Alta Frequência de Auroras (Haarp, na sigla em inglês) é um projeto norte-americano iniciado em 1999 para estudar a propagação de ondas na ionosfera, camada atmosférica situada entre 70 e mil km de altitude, e rica em partículas eletricamente carregadas.
O programa é sediado em Gakona, no Alasca, e financiado pela Força Aérea e pela Marinha dos Estados Unidos, por sua Agência de Defesa para Projetos de Pesquisa Avançados e pela Universidade do Alaska. Esse tipo de estudo pode ajudar a desenvolver novas tecnologias para telecomunicações e navegação. Consta que o projeto está inativo desde maio de 2013, aguardando uma renovação de contrato com as instituições envolvidas.
O que provavelmente gerou desconfiança em relação ao estudo foi o financiamento por instituições militares e de defesa, além do modo de operação: o principal instrumento do experimento enviava à ionosfera um pulso ou um sinal contínuo de alta potência (com cerca de 3,6 megawatts, equivalentes à eletricidade consumida por cerca de 540 residências), para depois analisar a reação da ionosfera à descarga extra. As suspeitas levaram à alegação de que esse tipo de interferência na ionosfera poderia ter consequências danosas ao planeta, e até de que este seria o objetivo do projeto, o que aos olhos dos cientistas não parece ser verdade.
Vários artigos científicos resultantes das experiências foram publicados em renomadas revistas de pesquisa, atestando os objetivos do programa. Também é verdade que, desde seu início, surgiram ‘teorias de conspiração’, atribuindo ao projeto eventos observados no planeta, como inundações, terremotos, síndromes identificadas em soldados que atuaram na guerra do Golfo e outros. Nada disso jamais foi provado, mesmo que de forma superficial, indicando que se trata apenas de temor exagerado em relação a um estudo com características que atraem os formuladores e adeptos dessas teorias.
O financiamento militar é justificado pelo interesse em aprimorar sistemas de comunicação, em especial com submarinos, que usam a faixa de frequências investigada pelo Haarp, e pelo temor de que os momentos de pico do ciclo de 11 anos da atividade solar natural causem danos às comunicações e aos sistemas de geração de energia. Atualmente, estamos no pico de atividade de um ciclo solar, que vem provocando tempestades magnéticas.
Há uma área nova de pesquisa e aplicação, que pode ser chamada de ‘meteorologia espacial’ (space weather, em inglês) e que visa monitorar todas as interações de partículas e energia vindas do espaço, para minimizar problemas que possam ser gerados por uma erupção solar maior ou por eventos em outros objetos celestes.
Como a atuação dos sinais emitidos pelos instrumentos do Haarp ocorre em uma área relativamente pequena, em uma camada elevada da atmosfera, a probabilidade de qualquer tipo de interferência observável no mundo ou no clima terrestre é mínima.
Eder C. Molina
Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas
Universidade de São Paulo
Texto originalmente publicado na CH 313 (abril de 2014). Clique aqui para acessar uma versão resumida da revista.