Sou um professor de matemáticas e adoro poesia. As matemáticas fazem parte de minha experiência de vida. Portanto, não consigo ler uma obra sem que as matemáticas interfiram de alguma forma na leitura.
Foi isso que aconteceu quando me propus a ler o poema ‘José’, de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), em um curso de lógica. Fiquei analisando as escolhas de conectivos que esse poeta, contista e cronista brasileiro fez ao construir esse fantástico (e cruel) poema.
Três são os conectivos lógicos observados em ‘José’: i) a conjunção, representada matematicamente pelo símbolo ‘∧’, que pode ser traduzido para o português como ‘e’; ii) a disjunção, representada por ‘∨’, traduzida por ‘ou’; iii) o condicional ‘→’, traduzido por ‘se’…, ‘então’…’.
Esses conectivos servem para unir sentenças declarativas, expressões que podem ser classificadas como falsas ou verdadeiras. Exemplo de sentença declarativa: “Estamos no inverno”. Ela pode ser classificada como falsa (F) ou verdadeira (V). Outra sentença declarativa: “O céu está sem nuvens”.
Representemos “Estamos no inverno” por ‘p’, e a sentença “O céu está sem nuvens” por ‘q’. Podemos unir essas duas sentenças por meio dos conectivos:
(1) p ∧ q
“Estamos no inverno ‘e’ o céu está sem nuvens”.
Note que p ∧ q só será verdadeira se tanto p quanto q forem verdadeiras. Se for falso que “Estamos no inverno”, p ∧ q será falsa. Se for falso que “O céu está sem nuvens”, p ∧ q também será falsa.
(2) p ∨ q
“Estamos no inverno ‘ou’ o céu está sem nuvens”.
Em língua portuguesa, o ‘ou’ é verdadeiro se as duas sentenças que ele conecte forem verdadeiras ou se só uma o for. Mas o contexto é importante. Vejamos.
Se, em um almoço, você diz “Vou comer carne ou vou comer peixe”, ninguém espera que você coma tanto carne quanto peixe nessa refeição. Mas se, ao iniciar suas férias, você declarar “Vou ao teatro ou ao cinema”, ninguém lhe chamará de mentiroso se você for tanto a um quanto ao outro.
O segundo ‘ou’ é um ‘ou’ includente, porque inclui a possibilidade de as duas sentenças serem verdadeiras. O primeiro é um ‘ou’ excludente: só uma das sentenças pode ser verdadeira.