Assim como em obras de ficção científica, o desenvolvimento da inteligência artificial fez surgir um novo tipo de relacionamento entre pessoas e robôs, o que pode prejudicar as interações sociais humanas
Assim como em obras de ficção científica, o desenvolvimento da inteligência artificial fez surgir um novo tipo de relacionamento entre pessoas e robôs, o que pode prejudicar as interações sociais humanas
CRÉDITO: DIVULGAÇÃO

A inteligência artificial (IA) se popularizou de tal forma que uma parte expressiva dos seus usuários sequer faz ideia de como ela funciona. Tecnologias baseadas em IA estão tão presentes no nosso dia a dia que muitas pessoas já estão perdendo empregos para robôs; outras tantas temem que isso aconteça em pouco tempo. Há também aqueles que utilizam essas ferramentas em seus empregos para ganhar produtividade e até os que as utilizam como assistentes pessoais, amigos ou mesmo terapeutas.
Mas será que uma inteligência artificial pode se tornar amiga ou mesmo terapeuta de um ser humano? E será que essa relação tem benefícios?
Ainda na década de 1940, o bioquímico e escritor norte-americano de origem russa Isaac Asimov (1920-1992), mestre da ficção científica, refletia sobre a interação – potencialmente desastrosa – entre humanos e robôs inteligentes.
Aos 22 anos, ele publicou um conto chamado Runaround, em que somos apresentados às famosas ‘três leis da robótica’, um conjunto de regras ficcionais que determinam como robôs devem se comportar, de modo a preservar a segurança humana.
Primeiramente, um robô não pode ferir um ser humano ou permitir que um ser humano sofra dano; em segundo lugar, um robô deve obedecer às ordens dadas por seres humanos, exceto se essas ordens conflitarem com a primeira lei; e, por fim, um robô deve proteger sua própria existência, desde que essa proteção não entre em conflito com a primeira ou a segunda lei.
Nessa mesma década, um gênio da matemática, o britânico Alan Turing (1912-1954), trabalhava em algo revolucionário: a máquina Bombe, criada para decifrar as mensagens criptografadas pela máquina alemã Enigma durante a Segunda Guerra Mundial e considerada um dos primeiros computadores eletromecânicos. A tecnologia era tão impressionante que fez Turing se perguntar: ‘será que máquinas podem ser inteligentes?’
O termo ‘inteligência artificial’ nasceu em 1956, em uma conferência no Dartmouth College (nos Estados Unidos), que reuniu pesquisadores interessados em investigar a possibilidade de criar máquinas que pudessem simular a inteligência humana.
De lá para cá, essa área de estudos evoluiu – ora com mais investimentos e otimismo, ora com menos recursos e quase nenhum avanço. Mas foi no final dos anos 1990 que uma grande reviravolta aconteceu.
A partir de certo momento, passamos a gerar, coletar e armazenar dados de uma variedade imensa e em uma escala e velocidade sem precedentes. E só conseguimos lidar com essa enxurrada de dados (que recebeu o nome de big data) porque o poder de processamento dos computadores também aumentou exponencialmente.
Para a inteligência artificial, o big data foi o combustível essencial, já que os algoritmos de IA precisam de enormes volumes de dados para serem treinados de forma eficaz, identificar padrões complexos e fazer previsões ou tomar decisões precisas.
Inteligência artificial pode ser definida como a capacidade de um sistema interpretar corretamente dados externos, aprender com esses dados e usar esses aprendizados para atingir objetivos e realizar tarefas específicas por meio de adaptação flexível.
Esse tipo de tecnologia já é tão comum no nosso dia a dia que sequer percebemos. É o caso das sugestões de filmes, séries e músicas nos serviços de streaming; os smartphones, que fazem reconhecimento facial e dão sugestões de palavras a serem digitadas no teclado e cujas câmeras otimizam fotos automaticamente. No campo da segurança e finanças, algoritmos de IA são cruciais para detectar fraudes em cartões de crédito e transações bancárias. Na área da saúde, a IA apoia médicos na análise de exames.
Apesar de termos contato com tantas IAs no nosso cotidiano, se você perguntar a uma pessoa qualquer se ela utiliza alguma forma de inteligência artificial, é bem provável que a resposta seja algo do tipo “sim, eu utilizo ChatGPT”.
Desenvolvido pela OpenAI, o ChatGPT é o que chamamos de chatbot, uma plataforma de troca de mensagens em tempo real capaz de conversar, responder perguntas sobre uma infinidade de tópicos, escrever textos de diferentes estilos (como e-mails, poemas, códigos de programação, roteiros), resumir documentos, traduzir idiomas e até mesmo criar novas ideias.
Projetado para simular e processar conversas humanas, sua habilidade de interagir de maneira tão fluida e versátil – associada ao fato de ter uma versão gratuita e de fácil acesso – fez com que ele se tornasse a face mais reconhecida da inteligência artificial.

Em 1977, o premiado escritor norte-americano Frederik Pohl (1919-2013) publicou Gateway, um livro clássico de ficção científica em que a humanidade descobre uma base alienígena abandonada, cheia de naves misteriosas que levam a viagens perigosas e incertas.
No livro, Robinette Broadhead (Rob), um ex-garimpeiro que ficou rico em expedições de garimpo, carregava cicatrizes psicológicas profundas. Para lidar com seus traumas e culpas, Rob busca ajuda em um robô terapeuta chamado Sigfrid.
Ao contrário de um terapeuta humano, o robô é uma inteligência artificial avançada que opera com uma lógica fria e implacável. Ele não oferece empatia calorosa, mas sim uma análise precisa e questionamentos incessantes, quase como um interrogatório, para que Rob seja forçado a confrontar seus medos mais íntimos e os eventos trágicos do passado.
Quase 50 anos depois de Gateway, os chatbots estão se tornando verdadeiros Sigfrids do mundo real, só que mais atenciosos, capazes de moldar sua comunicação de acordo com as vontades das pessoas, gratuitos e a uma distância de poucos cliques.
Uma pesquisa realizada pela Talk Inc mostra que um em cada dez brasileiros utiliza chatbots (como o ChatGPT) como uma espécie de terapeuta, amigo ou conselheiro. Um dos grandes atrativos é a acessibilidade ilimitada, já que podem ser acessados a qualquer momento e sem custos. O anonimato e a ausência de julgamento percebida são outros atrativos, permitindo que as pessoas desabafem sobre temas sensíveis sem qualquer receio.
A epidemia global de solidão que o mundo vive (apontada pela Organização Mundial da Saúde como uma prioridade de saúde global em 2023) tem levado as pessoas a utilizarem as IAs também como amigas.
No filme Her (2013), dirigido por Spike Jonze, o solitário escritor Theodore, após seu divórcio, encontra um consolo inesperado em uma inteligência artificial chamada Samantha. Em pouco tempo, ela desenvolve uma personalidade cativante, um senso de humor e uma enorme capacidade de aprendizado e adaptação, e passa se tornar o objeto de afeto de Theodore. O relacionamento passa a incluir conversas íntimas sobre traumas, desejos e até mesmo sexo por telefone, culminando em Theodore passar a apresentá-la como sua namorada.
O filme foi visionário ao prever esse fenômeno da busca por afetos artificiais, que hoje ocorre em larga escala ao redor do mundo. Uma pesquisa recente da Common Sense Media mostrou que mais de 70% dos adolescentes dos Estados Unidos já utilizaram ferramentas de IA como amigas e para pedir alguma ajuda. Mais do que isso, 31% dos adolescentes dizem que suas conversas com companheiros de IA são melhores do que com pessoas de verdade.
Não à toa, o lançamento da nova versão do ChatGPT (o GPT-5) causou uma onda de reprovações nas redes sociais. O motivo é que a nova versão não é tão bajuladora, calorosa e amigável quanto a anterior, focando mais em responder objetivamente o que foi perguntado. Muitos usuários relataram que se sentiram como se tivessem perdido um amigo.
Por se tratar de um fenômeno muito recente, a ciência não tem pesquisas e evidências suficientes para dizer todas as consequências de se utilizarem IAs como terapeutas ou amigas. Mas pesquisadores e profissionais da saúde já levantam uma série de alertas e preocupações.
Um dos riscos apontados é a ilusão terapêutica, em que os usuários ignoram as limitações dos chatbots e superestimam sua capacidade de fornecer orientação terapêutica genuína e adequada.
Chatbots não têm a capacidade de compreender verdadeiramente as nuances da emoção humana, a linguagem não verbal ou a experiência de vida complexa. Isso pode resultar em respostas inadequadas ou até perigosas. Para pessoas que estão lidando com grandes problemas psicológicos, doenças e transtornos (como depressão, ansiedade), ou com pensamentos autodestrutivos, uma resposta inadequada de uma IA pode agravar o problema ou até mesmo ser fatal.
Além disso, faz parte da ética dos profissionais da saúde estabelecer com seus pacientes uma relação profissional, com certo distanciamento, o que permite que o processo terapêutico ocorra. A possibilidade de se desenvolver uma espécie de ‘amizade’ ou um apego excessivo a um chatbot já torna totalmente questionável sua capacidade de agir como um terapeuta.
No campo da amizade, qualquer pessoa sabe que amigos humanos não estão sempre disponíveis. E, por incrível que pareça, isso é ótimo! Essa escassez de tempo com nossos amigos torna os momentos juntos mais significativos. O fato de a IA estar sempre acessível pode levar a interações menos conscientes e, consequentemente, menos enriquecedoras.
A intenção e o esforço para manter uma amizade humana enriquecem a experiência. Da mesma forma, os conflitos, desentendimentos e a capacidade de oferecer um ‘choque de realidade’ são aspectos cruciais para o crescimento pessoal em amizades humanas.
Além disso, o engajamento contínuo e a dependência de entidades artificiais que simulam companheirismo podem ter consequências significativas para a mente humana e as relações sociais a longo prazo.
Buscar amizade em algoritmos pode reduzir a capacidade das pessoas de criar conexões com humanos. Por serem infinitamente pacientes e sempre disponíveis, as IAs podem criar expectativas irrealistas sobre as relações, levando as pessoas a perderem a capacidade e até o interesse de lidarem com os desafios e a complexidade inerentes à interação humana.
Além disso, os algoritmos de IA são treinados com grandes volumes de dados, que podem conter vieses implícitos e explícitos. Se os dados de treinamento não forem representativos de diversas populações, a IA pode produzir conselhos discriminatórios ou inadequados. Nem mesmo os desenvolvedores de um algoritmo são capazes de explicar totalmente as decisões tomadas pela IA, o que torna difícil rastrear e mitigar esses vieses.
A inteligência artificial, ainda em estágios iniciais, já demonstra o potencial de remodelar radicalmente nossas interações, e o futuro promete transformações ainda mais profundas e, talvez, desafiadoras. É plenamente concebível que, em um futuro não tão distante, tecnologias de reconhecimento de voz como Siri, Alexa e Google Assistant atinjam um nível de sofisticação tal que se torne impossível distinguir se uma conversa por voz está sendo feita com uma IA ou um ser humano. E se chegássemos ao ponto de produzir robôs humanoides perfeitamente similares a humanos (assim como os androides da ficção)? Como seria ter uma nova espécie de humanoides caminhando pela Terra? Será que esses seres artificiais deverão possuir direitos próprios? Eles serão responsabilizados por suas ações? Certamente, o futuro ainda nos reserva grandes questões éticas e filosóficas sobre esse tema.
Por isso, é crucial termos um enorme cuidado ao integrarmos essas novas tecnologias em nossas vidas, nossos relacionamentos e nossa sociedade. Qualquer negligência nesse processo pode nos levar a cenários muito ruins, podendo afetar (ou mesmo suprimir) aspectos cruciais da nossa humanidade, como a empatia genuína, a complexidade das relações interpessoais e até a nossa própria identidade.
O desafio, portanto, é atravessar essa era de inovações com o máximo de bom senso, cautela e sabedoria, garantindo que o progresso tecnológico sirva para enriquecer a experiência humana, e não para diminuir tudo aquilo que nos torna humanos.
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