Penso que seja bastante apropriado ao espírito científico inaugurar essa coluna, onde pretendo me debruçar sobre narrativas literárias, com uma reflexão sobre o que é literatura. Terry Eagleton, em Teoria da Literatura, destaca uma questão complexa e de extrema importância para os profissionais cujo livro é o principal instrumento de trabalho. Para ele, definir o que vem a ser literatura não é tarefa fácil, pois essa definição deve levar em conta diversos aspectos, como os tempos e contextos em que as narrativas são produzidas.
Dizer, por exemplo, que literatura é a “escrita imaginativa” não resolve o problema, pois as diferenças entre fato e ficção, entre verdade histórica e verdade artística não são suficientes. As histórias em quadrinhos, por exemplo, não são verdadeiras, são narrativas fictícias, no entanto, não são consideradas literatura por grande parte dos críticos. O mesmo podemos afirmar das narrativas religiosas – bíblicas, de matriz africana, orientais etc. – que tanto podem ser lidas como ficção ou como realidade histórica, a depender da crença ou descrença de cada leitor.
O filósofo e escritor inglês G. K. Chesterton (1874-1936), mais dedicado a escrever ensaios e análises críticas de obras do que a fazer ficção, diz, em ‘O Defensor’, que “a literatura é um luxo e a ficção, uma necessidade”. Isso porque partilha da crença de que todos temos necessidade de ficção. O homem cria e partilha histórias desde que está no mundo, como recurso para entender, interpretar e construir esse mundo.
Um grupo de antílopes ou de qualquer outro animal sedento, ao se aproximar do leito de um rio e o encontrar seco, sai em busca de outro rio, e, se não o encontra, acaba por morrer de sede. Os humanos, na mesma situação, depois de buscarem incessantemente outras fontes, antes de se entregarem à morte vão interpretar, rezar, dançar, buscar culpados e inventar rituais para convencer os espíritos a mandarem chuva. Isso é criar história, é ficção e, de acordo com a escritora canadense Nancy Huston, em ‘A Espécie Fabuladora’, é necessidade.
Para Huston, a diferença entre nós e os animais é a mesma que existe entre consciência e inteligência, ou seja, o fato de existir e de se ter a consciência da existência. “A consciência é a inteligência mais o tempo, ou seja: a narratividade”, a ficção, a fabulação, a criação, a mimese.
Na poética, o filósofo grego Aristóteles diz que o ser humano é o animal mais mimético de todos, desde a infância realiza a mimese, pois é assim que apreende o mundo a sua volta, que o entende e o interpreta. É também o único que realiza a mimese com consciência. Isso quer dizer que todo ser humano é poeta? Não. Mas quer dizer que todo ser humano, se quiser, pode ser, mas para sê-lo precisa reconhecer o que decide imitar (gente, objeto, animal, ação), para depois manipular e elaborar esse material, dando-lhe forma de poesia, canto, drama, tragédia etc. Segundo Aristóteles, a diferença entre o poeta e o historiador é que o segundo narra os fatos que aconteceram e o primeiro, o que poderia acontecer ou o que ele deseja que aconteça.
Georgina Martins
Professora aposentada da Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro
Programa de Mestrado Profissional em Letras (Profletras)
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