Na ficção, o canibalismo já foi usado para controlar a superpopulação. Será essa uma possibilidade a ser considerada hoje?
Preocupações sobre a superpopulação humana não são novas. O economista e demógrafo inglês Thomas Robert Malthus (1766-1834) escreveu em 1798 um livro muito influente, intitulado Um ensaio sobre o princípio da população, que até hoje ainda é muito relevante e polêmico. A essência do texto de Malthus é a incompatibilidade da taxa de crescimento da população com a disponibilidade de recursos.
Malthus argumentou que, embora o crescimento populacional seja exponencial, haveria um momento em que o aumento linear aritmético na produção de alimentos não seria capaz de sustentá-lo. Segundo ele, essa situação levaria inevitavelmente a uma crise em que a restrição alimentar acabaria por controlar de forma natural o crescimento da população, mas não sem muito sofrimento, sobretudo entre os membros menos privilegiados da sociedade.
Malthus estava convencido de que seria difícil para uma sociedade, mesmo que ela fosse educada, adotar o planejamento familiar autoimposto. A simples observação da natureza mostrava que, sempre que as condições econômicas melhorassem, haveria crescimento populacional.
Assim, a advertência de Malthus sobre o desastre iminente foi acompanhada por recomendações. Ele sugeriu, por exemplo, que políticas sociais como as “leis dos pobres”, que garantiam auxílios às populações carentes, não deveriam ser implementadas. Em sua opinião, a ajuda sob a forma de apoio financeiro apenas encorajaria o crescimento das famílias, especialmente daquelas sem recursos.
O legado de Malthus é duradouro. Recentemente, os produtores de Os vingadores (Marvel comics), em seu filme A guerra do infinito,de 2018, apresentaram o arqui-inimigo Thanos, que se declara um malthusiano. Thanos é obviamente culto. Ele também deve ter lido o autor e crítico britânico Anthony Burgess (1917-1993), que contribuiu com ideias para atenuar os problemas da superpopulação. Seu romance presciente, The wanting seed (A semente maldita, na edição portuguesa), escrito em 1962, tem como enredo uma Londres superpopulada, com uma sociedade claramente dividida.
No romance de Burgess, o governo lida com o problema de recursos limitados, promovendo a reciclagem de materiais e incentivando a homossexualidade e a auto esterilização e, naturalmente, condenando a natalidade. A eutanásia também é aprovada. Mais tarde, descobre-se,no livro, que a reciclagem de materiais também incluía o canibalismo, que passa a ser praticado oportunamente na Grã-Bretanha como um meio de sobrevivência.