Há milhares de anos, tentamos encontrar respostas para perguntas fundamentais, como: De onde viemos? Para onde vamos? Por que estamos aqui? Da Antiguidade aos modernos experimentos em aceleradores de partículas e observações feitas em grandes telescópios, temos tentado criar uma visão unificada para entender nosso mundo.
Entre as várias propostas, a física tem sido uma das mais bem-sucedidas. Suas teorias são quase sempre simples e abrangentes, com um número pequeno de pressupostos que servem de alicerces para um edifício sólido de conhecimento. Essas fundações se desdobram em diferentes patamares de compreensão da natureza. Em alguns momentos, esse edifício sofreu ‘tremores’ que criaram ‘rachaduras’ em suas bases, mas as reformas levaram a uma estrutura ainda mais rígida.
Exemplo disso é o do filósofo grego Pitágoras (c. 570-c. 495 a.C.), um dos primeiros a estabelecer um elo entre a regularidade dos eventos celestes e as consonâncias e dissonâncias das notas musicais que os astros produziriam em seus movimentos regulares. O universo todo tocaria uma melodia universal: a música das esferas.
Quase mil anos depois, o astrônomo alemão Johannes Kepler (1571-1630), também inspirado pela busca da harmonia nos céus, imaginou que os seis planetas então conhecidos (Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno) estariam relacionados com o fato de existirem apenas cinco sólidos regulares: tetraedro, cubo, octaedro, dodecaedro e o icosaedro, com quatro, seis, oito, 12 e 20 faces, respectivamente.
Kepler propôs que cada um desses sólidos era circunscrito por uma esfera, de forma a se obterem seis esferas concêntricas cujos raios seriam iguais às trajetórias circulares dos planetas em torno do Sol, colocado no centro desse arranjo. Embora elegante, esse modelo é apenas uma bela construção matemática e – hoje, sabemos – não representa a realidade, pois existem outros planetas em nosso Sistema Solar e milhares deles orbitando outras estrelas.
Contudo, a contribuição mais importante de Kepler foi a proposição de três leis que descrevem o movimento planetário com grande precisão. Elaboradas a partir da busca de uma forma para descrever os movimentos celestes, elas valem não só para os planetas do Sistema Solar, mas também para o movimento de todos os corpos celestes, como cometas, estrelas e até galáxias.
As ideias de Kepler e de outro grande astrônomo à época, o italiano Galileu Galilei (1564-1642), foram fundamentais para que, anos mais tarde, o físico britânico Isaac Newton (1642-1727) desenvolvesse as leis do movimento e a lei da gravitação universal, que, combinadas, tiveram a grande capacidade de descrever os movimentos terrestres e celestes, com uma precisão nunca antes obtida. As teorias de Newton ficaram por quase 250 anos como a visão mais profunda que tínhamos do universo.
No início do século passado, novos resultados experimentais e novas teorias levaram a uma revolução na física. Com o advento da física quântica e da teoria da relatividade, a visão do universo mudou completamente.
A física quântica nos trouxe mudanças radicais sobre conceitos como energia, momento angular, ondas e partículas, sendo aplicada na descrição dos átomos e das moléculas. A teoria da relatividade geral, que alterou os conceitos de tempo e espaço, trata dos fenômenos que envolvem a gravidade, levando-nos a uma descrição do universo em larga escala.
Essas duas teorias têm um enorme poder de predição, mas não podem ser aplicadas simultaneamente para descrever um mesmo fenômeno físico, pois seus fundamentos são incompatíveis. Um dos grandes desafios da física é encontrar uma única teoria que consiga descrever simultaneamente os resultados da física quântica e da relatividade geral (ver, nesta edição, ‘Batalha de gigantes’).
Teorias como a de supercordas e da gravidade quântica foram propostas com esse objetivo, mas esses modelos ainda estão longe de serem validados experimentalmente.
Talvez, ao longo deste século, novas ideias e descobertas possam ampliar a nossa compreensão da natureza. Como a história tem mostrado, não será surpresa se mudarmos novamente nossa visão do universo.
Adilson de Oliveira
Departamento de Física,
Universidade Federal de São Carlos (SP)
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