Sobre o encanto das coisas comuns

Livro estimula a contemplação da beleza e da complexidade do mundo em que vivemos

Na lápide do escritor mineiro Fernando Sabino (1923-2004) lê-se a seguinte frase, de sua própria autoria: “Nasceu homem, morreu menino”. Por uma razão que de imediato não percebi, esta frase ecoava em minha cabeça enquanto lia o livro Tempestade numa xícara de chá, de Helen Czerski – física, oceanógrafa e pesquisadora da University College London.

Numa época onde os poucos livros de divulgação científica existentes são colocados lado a lado nas livrarias com os de autoajuda e pseudociências, a obra de Helen é um convite para o leitor fazer uma pausa. Uma pausa no olhar desatento e desassombrado com relação ao mundo que vivemos, palco diário de diversos fenômenos naturais e artificiais, os últimos propiciados pelo desenvolvimento tecnológico. Nesta pausa, a partir de uma “troca de lentes”, o livro reconduz nosso olhar – antes desatento – a diversos fenômenos, analisando-os a partir da ótica da física e suas articulações com as demais áreas do conhecimento, realçando o legado cultural das ciências para nossa civilização.

Tempestade numa xícara de chá
Helen Czerski
Editora Record, 2018, 296p

Tempestades, eletrônica de televisores, bússolas magnéticas, movimento de placas tectônicas, terremotos, polinização das flores, condução da água ao topo em sequoias… Em cada assunto a autora esmiúça com cuidado os princípios físicos por trás de cada fenômeno, culminando com um capítulo final onde realça as interconexões entre a vida, a Terra e a sociedade.

Para um leigo, o livro é uma rica fonte de informações que, sem dúvida, ampliará sua cultura científica a partir de uma leitura agradável e que cobre uma gama imensa de assuntos. Para os profissionais da ciência, a obra é um lembrete para invertermos a frase do epitáfio do escritor Fernando Sabino, para deixarmos um pouco de lado o trabalho de adulto (cientista) e (re)lembrar  o que encantou aquele(a) menino(a) lá no passado, levando-o(a) a se tornar um homem (mulher) da ciência. Nosso trabalho especializado nos leva a mergulhar em detalhes cada vez mais específicos da natureza e de seus fenômenos, e aí vem o livro da Helen recordar que – por vezes – é bom dar uma pausa nesse mergulho, caminhar alguns passos para trás e contemplar a beleza e a complexidade da grande pintura que é o mundo em que vivemos.

Adriano de Souza Martins

Instituto de Ciências Exatas
Universidade Federal Fluminense

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