Experiência de mapeamento participativo no Quilombo da Marambaia apresenta-se como meio para evidenciar e tornar conhecidas porções territoriais muitas vezes esquecidas.
Experiência de mapeamento participativo no Quilombo da Marambaia apresenta-se como meio para evidenciar e tornar conhecidas porções territoriais muitas vezes esquecidas.
Na Ilha da Marambaia, quilombolas dançam jongo
CRÉDITO: FOTO: TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL
Já conversamos por aqui que mapeamento participativo não é algo novo. Como tudo que surge, ou ressurge, ocorre inicialmente uma fase de imersão sobre os conceitos e rótulos que são dados aos instrumentos ou métodos adotados. É fato que existem diferentes formas de mapeamento e elaboração de cartografias ditas sociais ou populares, que lidam com múltiplos temas e recortes espaciais, bem como escalas variadas. Muitos são os especialistas nesta área e as experiências associadas a diversas realidades, envolvendo ou não as novas tecnologias, começam a se avolumar.
Esse ressurgimento, ou revalorização, da participação comunitária na elaboração de mapeamentos aparece na esteira dos anseios por um levantamento rápido e representativo de realidades complexas, que fogem às técnicas usuais de levantamento de dados, porque demandam relações de confiança, o que, por sua vez, exige tempo. Acrescenta-se ainda o fato de que, na maioria das vezes, este conhecimento não é explícito, sendo necessária a utilização de métodos lúdicos de integração para a compreensão e estruturação dessas informações. E, sem dúvida, a representação espacial é o instrumento de maior apelo neste processo.
Atualmente, esses tipos de bases de dados, estruturadas em mapas ou tabelas, têm sido de reconhecido apoio à tomada de decisão para diferentes problemas, e adotadas como referência até pelo Ministério Público.
Em um trabalho de campo composto por professores e alunos de universidades públicas do Rio de Janeiro, tive a oportunidade de visitar o Quilombo da Marambaia, que fica na ilha que leva este nome e na restinga homônima, inseridas no contexto da baía de Sepetiba. A área é de difícil acesso. O trajeto é feito de barco e com autorização prévia para entrada, por se tratar de um complexo territorial de proteção. O foco era, entre outras coisas, conseguir levantar parte da história do quilombo por meio do registro das memórias e materiais disponíveis. A experiência foi incrível.
Foi uma oportunidade de misturar diferentes formas de interação com um grupo de faixa etária variada, o que exige cuidados especiais para manter o interesse de todos nas dinâmicas aplicadas. A roda de conversa, trazendo aspectos culturais locais, incluindo cantos e danças típicas, além do processo de contação de histórias, é um recurso comumente adotado. Um grande mapa e uma imagem de satélite sempre ajudam no reconhecimento do território, possibilitando a compreensão topológica das localidades e de seus atores. Esse mapa, que chega “mudo”, sai dessas experiências mais colorido e falante, carregando informações valiosas sobre o passado, o presente e o futuro desenhados pelas pessoas que vivem na localidade. Entre muitas coisas, os conflitos territoriais existentes na área são sempre os mais ressaltados. Oficinas de desenhos também costumam ser exploradas. As crianças são as que mais aproveitam esta forma de expressão. E com que facilidade apresentam seus conhecimentos e expectativas!
Termos ficado lá alguns dias, participando da rotina dos quilombolas, alimentação, moradia, abriu os olhos dos integrantes do grupo de pesquisa para uma realidade pouco conhecida e divulgada. Entendemos que escutar os medos e as reivindicações também fazia parte desse processo de mapeamento, uma vez que pode ser considerado mais um instrumento de resistência.
Não há dúvidas de que a possibilidade de inclusão destas informações em mapas, envolvendo ainda questões de resgate de uma geonímia carregada de história e tradição, é um meio relevante de dar visibilidade a porções territoriais muitas vezes esquecidas, muitas vezes soterradas.
Lembrei-me muito de Bacurau.
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