Plantas no combate ao mercúrio

Instituto de Química
Universidade Federal do Rio de Janeiro

Processo natural chamado fitoextração se apresenta como promissor para reduzir as taxas de mercúrio no meio ambiente

CRÉDITO: FOTO FELIPE WERNECK/IBAMA VIA FLICKR

Nos últimos anos vimos uma explosão do garimpo em terras indígenas. Desde então, notícias sobre o impacto da contaminação de mercúrio – principalmente entre Kayapós, Mundurucus e Yanomamis – persistem em diferentes meios de comunicação. Os relatos são chocantes e incluem corpos deformados, problemas neurológicos e graves atrasos no desenvolvimento de crianças. O mercúrio contamina o solo, a água e os peixes consumidos por essas populações. Além disso, a prática do garimpo ilegal é acompanhada pela sedimentação dos rios, pela apropriação ilegal de terras e pelo aumento da violência.

Em artigo publicado nesta edição, somos apresentados a uma arqueologia da utilização do mercúrio e observamos como a nossa relação com esse elemento se transformou ao longo da história. Batizado com o nome do deus reconhecido por sua perspicácia e inteligência, o mercúrio já foi associado à vitalidade na China antiga, esteve presente na descoberta do oxigênio e tapou os buracos de cárie nos dentes de algumas gerações (felizmente, desenvolvemos as resinas fotopolimerizáveis). Porém, nos tempos atuais, vivemos um paradigma onde o mercúrio é um vilão ambiental, e compreendermos esse momento é fundamental para unirmos forças e encontrarmos soluções.

O mercúrio pode ser emitido para o meio ambiente por meio de processos naturais, como erupções vulcânicas e intemperismo rochoso.  Porém, a ação humana contribuiu de forma significativa para a disseminação desse elemento em diferentes ecossistemas. De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), as atividades humanas aumentaram as concentrações atmosféricas de mercúrio em cerca de 450%, na comparação com os níveis naturais. O garimpo artesanal de ouro é o principal responsável, contribuindo com cerca de 38% das emissões. Porém, a combustão estacionária de combustíveis fósseis também tem papel relevante: contabiliza 24% das emissões. Ela consiste na queima de combustíveis fósseis sólidos, líquidos ou gasosos para a geração de energia em equipamentos estacionários, como caldeiras, fornos, turbinas, aquecedores e incineradores. Dentre os combustíveis fósseis, o principal responsável pelas emissões de mercúrio é o carvão. 

Nesse momento, cientistas em todo o mundo buscam soluções para remover o mercúrio do meio ambiente, indo desde o uso de polímeros adsorventes até materiais nanoestruturados bastante avançados do ponto de vista tecnológico. No entanto, uma das estratégias mais elegantes e promissoras é o uso de plantas capazes de remover substâncias formadas a partir do mercúrio na natureza, em um processo chamado fitoextração.

Na fitoextração são utilizadas plantas de crescimento rápido, que toleram altas concentrações de mercúrio. Elas absorvem o mercúrio presente no solo através de suas raízes e o transportam para suas partes aéreas (estrutura da planta que se encontra acima do solo), onde ele é compartimentalizado em seus tecidos. Algumas características importantes da planta para o sucesso desse processo são alta capacidade de produzir biomassa em suas partes aéreas e, principalmente, alta tolerância ao mercúrio. 

Plantas conhecidas como hiperacumuladoras são as mais adequadas para a fitoextração e algumas delas podem exceder em 100 ou mais vezes as concentrações normais de metais ou metaloides acumulados em sua biomassa sem apresentar sinais de fitotoxicidade. Após a bioacumulação, a parte aérea da planta contendo o mercúrio pode ser removida e transportada para locais adequados, onde o mercúrio pode ser tratado e receber um destino que não cause impactos ao meio ambiente. Dentre algumas espécies promissoras estão a Achillea millefolium, a Marrubium vulgare e a Rumex induratus.

Evidentemente, a fitoextração sozinha não será capaz de resolver os problemas relacionados às emissões antropogênicas de mercúrio – problema que deve ser tratado menos no âmbito da remediação e mais no contexto do desenvolvimento de políticas públicas e no controle das emissões. Entretanto, ao contrário do uso de materiais avançados e de soluções de ponta muitas vezes dominadas apenas por empresas de tecnologia, plantas podem ser facilmente manejadas por diferentes pessoas e em diferentes ambientes, o que nos faz refletir sobre a possibilidade da implementação de soluções locais e de maior autonomia na resolução de problemas ambientais.

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