Rede Ressoa Oceano
Com 40% das praias brasileiras afetadas pelo fenômeno, é crucial preservar os ecossistemas naturais e delimitar a ocupação humana, afastando as construções da linha da costa
CRÉDITO: FOTO ADOBE STOCK
Nos últimos anos, tornou-se comum caminhar por uma praia e encontrar restos de construções que sucumbiram ao avanço do mar. Moradores locais costumam relatar que, pouco tempo atrás, a zona afetada pelas marés estava bem mais distante das edificações. Duas hipóteses surgem: o mar está avançando ou a cidade se expande em sua direção. Ambas formulações estão corretas. E as consequências são preocupantes.
A erosão costeira é um fenômeno natural causado pelo desequilíbrio no balanço sedimentar de uma praia. Em condições normais, as praias recebem sedimentos contínuos por meio da ação das ondas e dos ventos, que trazem materiais dos rios, dunas, falésias e rochas. Mas, quando esse suprimento é interrompido ou reduzido, há um déficit sedimentar, levando à erosão da linha costeira. O inverso também acontece: quando chegam mais sedimentos do que saem, ocorre a progradação costeira.
De acordo com o Panorama da Erosão Costeira no Brasil, publicado em 2018 pelo Ministério do Meio Ambiente, cerca de 60% das praias do país são impactadas por processos erosivos e de acúmulo de sedimentos. Com uma extensão litoral de aproximadamente 7,5 mil quilômetros, a erosão se tornou um dos maiores desafios para as cidades costeiras. As regiões mais afetadas são o Norte e o Nordeste, que apresentam índices de erosão de 60% e 65%, respectivamente.
Os dados do Panorama demonstram que os estados brasileiros mais afetados pela redução da linha de costa são Amapá (65%), Pará (60%), Rio Grande do Norte (60%) e o Rio Grande do Sul (49%) (figura 1). Os estados que apresentaram uma piora significativa, com base nos últimos monitoramentos, são Pernambuco (32%), que tem tentado frear esse avanço com obras de contenção, e Ceará (30%, mais 17% de tendência erosiva). No Ceará, apenas dois dos 20 municípios costeiros não apresentaram erosão.
Figura 1. Mobilidade da linha de costa dos estados brasileiros em porcentagem
CRÉDITO: PANORAMA DA EROSÃO COSTEIRA NO BRASIL / 2018
É verdade que fenômenos naturais, como períodos de seca, que impedem a reposição de sedimentos pelos rios; a elevação do nível do mar causada pelas mudanças climáticas; chuvas intensas; ciclones e ressacas marítimas, podem contribuir para esse processo. No entanto, como destacou o oceanógrafo Michel Mahiques, da Universidade de São Paulo, e um dos coautores do Panorama, em entrevista à Revista Pesquisa FAPESP em 2018: “É muito mais fácil culpar o aquecimento global do que responsabilizar empresas e prefeituras”.
A ocupação urbana desordenada e a falta de planejamento por parte do poder público são as grandes responsáveis pela aceleração da erosão costeira nos dias atuais, prejudicando a dinâmica natural das áreas litorâneas e fazendo com que processos que ocorreriam ao longo de décadas aconteçam com maior rapidez.
No Brasil, mais da metade (54%) da população – cerca de 111 milhões de pessoas – vivem no litoral. Embora o país tenha um litoral extenso, o adensamento urbano exerce uma pressão significativa sobre o ambiente costeiro, tornando ainda mais urgente a implementação de um planejamento eficaz para mitigar os impactos da ocupação nessas áreas.
Quando as cidades se expandem sem controle, muitas construções são feitas próximas ou até sobre as praias, impedindo a reposição natural de sedimentos via falésias e dunas e alterando a dinâmica das ondas e correntes, o que leva ao processo de erosão. A simples pavimentação das ruas impermeabiliza o solo e impede a absorção da água da chuva, aumentando episódios de inundações, que também agravam a erosão.
A remoção da vegetação nativa nas áreas costeiras, como os manguezais e as restingas, piora a situação, pois esses ecossistemas são fundamentais para a fixação do solo, impedindo que ele seja arrastado pelas ondas e pelos ventos. O crescimento urbano desordenado também está relacionado à construção de infraestruturas inadequadas, como estradas, portos e barragens, que interferem na dinâmica dos sedimentos e geram um déficit de reposição desses materiais.
Um dos casos mais emblemáticos de erosão costeira ocorre em Fortaleza (CE) devido à construção do Porto do Mucuripe, na década de 1940, e de um quebra-mar próximo. Essas intervenções alteraram a deriva litorânea, que segue no sentido Oeste-Leste, bloqueando o transporte natural de sedimentos.
Como resultado, o processo de erosão passou a afetar Fortaleza, levando à instalação de diversas obras de contenção, como espigões e enrocamentos, para mitigar os danos. Atualmente, há 17 espigões na cidade. Entretanto, essas intervenções não resolveram o problema, apenas deslocaram a erosão para o município vizinho de Caucaia.
A Praia do Icaraí, em Caucaia, foi a mais afetada, com a cidade perdendo 100 metros de faixa de areia nos últimos 40 anos. Para mitigar os danos, foram investidos 44 milhões de reais na construção de três espigões em formato ‘S’, uma alternativa aos modelos convencionais. A expectativa é que, ao contrário do que ocorreu em Fortaleza, essa estrutura não desloque o problema para as praias vizinhas, oferecendo uma solução mais adequada à dinâmica natural da região.
Figura 2. A erosão costeira, agravada por eventos como as ressacas marítimas, tem impactado ainda mais a Praia de Icaraí.
CRÉDITO: FOTO TUNO VIEIRA
Obras como engordas, enrocamentos e espigões são frequentemente utilizadas para mitigar os impactos da erosão e proteger áreas urbanas. Mas essas intervenções, embora necessárias em alguns casos, são soluções paliativas. Se não forem acompanhadas de ações estruturadas e monitoramento contínuo, podem agravar o problema. Isso se torna ainda mais preocupante com o aumento do nível do mar, impulsionado pelas mudanças climáticas, o que pode – e vai acelerar – o processo de erosão em várias regiões costeiras.
O cenário ideal para combater a erosão deve priorizar a recuperação e proteção dos ecossistemas naturais, fundamentais para a estabilização das áreas litorâneas. A delimitação rigorosa da ocupação urbana, afastando as construções da linha de praia, é uma medida essencial.
Além disso, a preservação de vegetações estabilizadoras, como manguezais, restingas e dunas, é crucial, uma vez que elas ajudam a fixar o solo e a reduzir a força das ondas e dos ventos. Soluções baseadas na natureza oferecem uma proteção mais sustentável e resiliente, fundamental para enfrentar os desafios da erosão e do avanço do mar.
*A coluna Cultura Oceânica é uma parceria do Instituto Ciência Hoje com a Cátedra UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano da Universidade de São Paulo e com o Projeto Ressoa Oceano, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
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