É fundamental prevenir o sofrimento e promover uma vida satisfatória para que todos os animais – inclusive as espécies aquáticas –, estejam livres ou vivendo em sistemas de produção, laboratórios de pesquisa, zoológicos ou em nossos próprios lares
CRÉDITO: FOTO ADOBE STOCK
No dia 5 de janeiro deste ano, o maior parque aquático da Europa, o Marineland Antibes, localizado na França, encerrou suas atividades que perduraram por mais de 50 anos. Além das questões envolvendo o confinamento de décadas, qual será o destino dos quase 4 mil animais, como orcas, golfinhos, ursos polares, pinguins e tubarões?
O fechamento do parque é resultado de diferentes pressões, como campanhas de organizações de proteção animal, redução do público em cerca de 60% na última década e a implementação da lei francesa, de 2021, contra maus-tratos a animais.
Felizmente, o bem-estar animal vem ganhando espaço na mídia, com polarização sobre o uso de animais em pesquisas, zoológicos, fazendas, e até como companhia. A ideia de garantir boas condições de vida aos animais parece intuitiva, mas, por trás desse debate, há uma ciência complexa. Então, o que significa ‘bem-estar animal’?
É possível imaginar que o contato mais próximo entre humanos e animais tenha gerado questões sobre como tratá-los melhor. A domesticação, iniciada há milhares de anos, provavelmente, foi um marco importante. Mas o bem-estar animal como ciência emergiu apenas no final da década de 1950, quando dois pesquisadores britânicos, o zoólogo William Russell (1925-2006) e o microbiologista Rex Burch (1926-1996), propuseram a inclusão do princípio dos 3 Rs na experimentação científica: redução, refinamento e substituição de animais.
Em 1964, a publicação do livro Animal Machines, da ativista e escritora britânica Ruth Harrison (1920-2000), denunciou os maus-tratos enfrentados pelos animais nos sistemas de produção, desenvolvidos, principalmente, após a Segunda Guerra Mundial. Como consequência dessa denúncia, o governo britânico encomendou, em 1965, uma investigação, liderada pelo médico e cientista irlandês Roger Brambell (1901-1970) sobre as condições vividas por esses animais, o que resultou no Relatório Brambell.
Tal relatório apontou recomendações fundamentais, conhecidas como as ‘Cinco Liberdades’, para assegurar condições mínimas de bem-estar dos animais de produção, evitando o sofrimento desnecessário. Aperfeiçoadas e oficializadas em 1979, as Cinco Liberdades defendem que os animais devem ser livres de fome e sede; desconforto; dor, lesões e doenças; medo e estresse; além de poderem expressar seus comportamentos naturais.
Descobertas posteriores trouxeram uma maior compreensão sobre aquilo que afeta o bem-estar dos animais. Em 1994, os cientistas norte-americanos David Mellor e Cam Reid propuseram o modelo dos ‘Cinco Domínios’ (nutrição, ambiente, saúde, comportamento e o estado mental ou afetivo) para entender melhor o que contribui para o bem-estar animal.
Na década de 2010, foram incorporadas novos aspectos a esse modelo, mostrando que apenas evitar o sofrimento não basta para alcançar um bom nível de bem-estar. Um conceito importante é a qualidade de vida: o bem-estar animal deve ser analisado, considerando tanto aspectos negativos quanto positivos. Isso inclui o alívio da dor, do medo e do estresse, mas também a promoção de emoções positivas, como curiosidade e prazer.
Em outras palavras, um animal que não sofre, mas está privado de estímulos prazerosos em seu meio, não está vivendo um estado ideal de bem-estar.
Tal relatório apontou recomendações fundamentais, conhecidas como a ‘Cinco Liberdades’, para assegurar condições mínimas de bem-estar dos animais de produção, evitando o sofrimento desnecessário
O bem-estar animal não se limita aos animais de produção, mas inclui pets, animais em laboratório, animais confinados em zoológicos ou alocados para outras atividades relacionadas ao lazer humano, e até animais em vida livre.
O adestramento é uma ferramenta para melhorar a qualidade de vida dos pets ou animais em zoológicos. Uma relação de confiança entre o cuidador e o animal ajuda a resolver problemas de comportamento, facilita manejos e oferece estímulos positivos aos animais.
Quanto aos animais de produção, é importante lhes garantir uma vida digna, mesmo que sejam destinados ao abate. Qualquer animal sob cuidados humanos deve ter uma vida que valha a pena ser vivida, uma vez que a qualidade de vida impacta o bem-estar animal e o produto final.
Embora existam diversos métodos para avaliar o bem-estar animal, indicadores comportamentais são muito utilizados, pois são mais fáceis de observar e podem ser analisados em tempo real, refletindo o estado emocional do animal. Isso é especialmente importante em sistemas de produção, onde as condições de manejo podem ser monitoradas sem a necessidade de equipamentos sofisticados.
No entanto, o estudo do bem-estar animal também envolve aspectos fisiológicos, como a avaliação da saúde e de hormônios associados ao estresse, como o cortisol. Mas aspectos emocionais e comportamentais, que indicam como os animais vivenciam suas interações com o ambiente e outros animais, são fundamentais para uma avaliação precisa de seu bem-estar.
Um animal física e mentalmente bem, com possibilidade de escolhas e estímulos positivos em seu ambiente de criação, também precisa de uma boa interação com os humanos. No caso dos pets, muitos tutores podem projetar suas necessidades emocionais sobre eles, gerando expectativas irreais, que prejudicam o bem-estar dos animais, trazendo distúrbios comportamentais, como a ansiedade de separação.
O estado psicológico do tutor também afeta o bem-estar do animal. Em situações de estresse ou outros problemas emocionais, o cuidado com o pet pode ser comprometido, afetando sua saúde e estado emocional.
Mesmo em condições de vida livre, o bem-estar dos animais pode ser afetado pelos seres humanos. Impactos sobre o meio ambiente, como derramamento de petróleo, poluição por microplásticos, desmatamento, queimadas, pesca e caça ilegal, afetam o bem-estar dos animais ao prejudicar os ambientes naturais onde vivem.
Um animal que não sofre, mas está privado de estímulos prazerosos em seu meio, não está vivendo um estado ideal de bem-estar
O bem-estar animal é um conceito multifacetado, que envolve tanto a prevenção do sofrimento quanto a promoção de uma vida satisfatória. Ao avaliar o bem-estar dos animais, é fundamental considerar aspectos negativos e positivos em relação à saúde, alimentação, ao ambiente, comportamento e estado mental. Assim, podemos garantir que eles tenham qualidade de vida, seja em sistemas de produção, pesquisas, zoológicos ou em nossos próprios lares.
E isso não se restringe aos animais terrestres. Hoje existem muitas evidências científicas indicando que peixes também sofrem e sentem dor. Mas há uma grande defasagem entre o que a ciência sabe e o que a sociedade entende sobre esses animais. No Brasil, sequer há normativa ou regulamentação sobre o abate humanitário de peixes. A portaria 365, que traz o regulamento técnico para evitar dor e sofrimento desnecessários no abate dos animais de produção, exclui os peixes.
Assim, quando se trata de bem-estar animal, ainda temos um longo caminho pela frente, principalmente para espécies aquáticas. Por que demoramos meio século para considerar o bem-estar dos animais do Marineland? Agora, temos o dever de não cometer um grande erro com o seu destino – assim como o de outros animais que agora estão em cativeiro.
No Brasil, sequer há normativa ou regulamentação sobre o abate humanitário de peixes. A portaria 365, que traz o regulamento técnico para evitar dor e sofrimento desnecessários no abate dos animais de produção, exclui os peixes
*A coluna Cultura Oceânica é uma parceria do Instituto Ciência Hoje com a Cátedra UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano da Universidade de São Paulo e com o Projeto Ressoa Oceano, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
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