Existe relação entre a quarentena e a queda da autoestima?

De certa forma, sim. Para entender como isso pode acontecer, é necessário entender o que é autoestima, mas, antes disso, compreender o que é autoconceito. O autoconceito diz respeito à percepção que um indivíduo tem de si próprio: como se vê, como percebe as características que possui, os papéis sociais que desempenha e o nível de habilidade que apresenta em determinadas atividades. A autoestima se refere a uma avaliação sobre esse autoconceito, isto é, a um julgamento positivo ou negativo que uma pessoa faz sobre si mesma. Podemos entender que esse julgamento varia em níveis, de pessoa para pessoa, sobre um contínuo que vai do extremo negativo ao extremo positivo. Tanto o autoconceito quanto a autoestima são formados e se atualizam na medida em que entramos em contato com a realidade e interagimos com os outros. Ao interagir, as pessoas têm a oportunidade de ouvir feedbacks, de observar o próprio comportamento em atividades sociais e, ainda, de comparar suas habilidades com as de outros. Assim, as interações sociais nos ajudam a formar uma ideia de quem somos (autoconceito) e a atribuir valor a nós mesmos (autoestima).

O afastamento físico e a forma como passamos a nos comunicar em meio ao isolamento social provocado pela pandemia de covid-19 pode estar interferindo na atualização do nosso autoconceito e, consequentemente, na nossa autoestima. Por exemplo: um esportista não tem a oportunidade de exercer uma das atividades que mais o caracterizam como ele mesmo, nem de comparar suas habilidades com as de outros esportistas; ou uma avó não tem a oportunidade de exercer um dos papéis que mais a definem com ela mesma, além de possivelmente receber menos feedbacks positivos sobre as suas habilidades como avó. Questões dessa ordem podem interferir negativamente na autoestima dessas pessoas. Portanto, pode-se levantar a hipótese de que o isolamento social, sobretudo se for muito longo, provocará redução dos níveis de autoestima. Assim, torna-se essencial que profissionais de saúde mental estejam aptos a propor estratégias de intervenções para preservar a autoestima das pessoas diante da pandemia.

 

Daniela Zibenberg, Nathalia M. Carvalho e Jean C. Natividade

Laboratório de Psicologia Social
PUC-Rio

Como ajudar o outro pode nos ajudar em tempos de quarentena?

O isolamento social, apesar de ser uma medida preventiva essencial na barreira de transmissão do novo coronavírus, pode desencadear consequências graves para a saúde mental, e até física, das pessoas que se submetem a ele. O confinamento pode gerar ansiedade e aumento de emoções negativas, diminuindo, assim, os níveis de bem-estar dos indivíduos. Considerando-se imprescindível a quarentena no combate à covid-19, cultivar hábitos e práticas que estejam associadas ao aumento do bem-estar pode ser a solução para a manutenção da saúde mental durante a pandemia.

Entre outras práticas, uma vem se destacando desde o início da quarentena de forma espontânea: a solidariedade. Seja por meio de palavras de incentivo e apoio, doações financeiras ou prestação gratuita de serviços, muitas pessoas têm se mobilizado a ajudar outras pessoas ou grupos. Alguns estudos apontam a preferência de indivíduos em compartilhar apoio com outros que enfrentam uma situação estressante semelhante, fazendo com que eles se afiliem a outras pessoas que compartilham suas circunstâncias. A ciência tem mostrado que esse tipo de comportamento é capaz de aumentar os níveis de bem-estar de quem os pratica.

Ajudar alguém implica, necessariamente, relacionar-se com o outro de alguma forma. De modo suplementar aos benefícios gerados pela solidariedade, estabelecer relacionamentos saudáveis também têm efeitos positivos na saúde e no bem-estar. Relacionamentos saudáveis incluem sentimentos de integração com a sociedade ou com uma comunidade, sensação de ser cuidado por alguém e a satisfação com a rede social, além de dispor de um tempo de qualidade com pessoas queridas. Apesar de a quarentena ser chamada de isolamento social, trata-se mais de um isolamento físico. Isso porque, diferentemente de outras pandemias – como a gripe espanhola –, a tecnologia atual viabilizou as relações sociais de várias maneiras. Portanto, não é preciso sair de casa para ajudar alguém e nem para manter e cultivar os relacionamentos.  Enfim, a solidariedade, além de ajudar a comunidade no enfrentamento à covid-19, pode ser uma ferramenta muito útil na busca de bem-estar e manutenção da saúde mental durante a pandemia.

 

Thainá Ferraz de Carvalho

Laboratório de Pesquisa em Psicologia Social
PUC-Rio

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