Especificamente em relação a história da produção desse medicamento, devemos ressaltar a dificuldade dos testes iniciais, uma vez que os princípios ativos (esteroides) eram obtidos principalmente de tecidos e secreções de animais, onde eram encontrados em baixíssimas concentrações. Por exemplo, estima-se que, para se obterem cerca de 12 mg de estrogênio, eram necessários ovários de 80 mil porcas.
Assim, a química esteroidal ganhou maior crescimento a partir do descobrimento de que certos inhames produziam, em altas concentrações, moléculas precursoras dos hormônios, o que movimentou principalmente a química do México, país onde o conhecimento tradicional sobre essas plantas, detido pelos camponeses, foi explorado pelos laboratórios que lá se instalaram.
Com quantidades suficientes das moléculas precursoras, as rotas químicas até os produtos finais logo foram desenvolvidas, o que permitiu que os experimentos em maior escala, com humanos, fossem feitos.
Os testes com o medicamento – que, posteriormente, viria a ser comercializado como a primeira pílula anticoncepcional – foram feitos pelos pesquisadores norte-americanos Gregory Pincus (1903-1967) e John Rock (1890-1984), em associação com a indústria farmacêutica G. D. Searle e apoio das norte-americanas Katharine McCormick (1875-1967) e Margaret Sanger (1879 – 1966), duas militantes das causas feministas à época e adeptas do controle de natalidade.
Inicialmente, Pincus e Rock testaram pacientes saudáveis, mas, por causa dos efeitos colaterais, muitas desistiram. Mais tarde, em uma saída completamente antiética, os pesquisadores passaram a usar pacientes psiquiátricos em seus estudos, que recebiam os medicamentos e tinham seus úteros examinados para o entendimento dos processos fisiológicos decorrentes dos tratamentos.
O primeiro teste em maior escala começou com estudantes de medicina em Porto Rico, mas, mais uma vez, por causa dos efeitos colaterais e do sofrimento dos exames, mais da metade desistiu.
Posteriormente, os testes passaram a ser conduzidos com mulheres pobres das vizinhanças da capital porto-riquenha, sem que muitas delas soubessem exatamente o que estava sendo testado. Finalmente, a Enovid foi liberada pela FDA (agência reguladora de medicamentos dos EUA), em 1957 – inicialmente, como regulador do fluxo menstrual e, em 1960, como anticoncepcional.Assim concluímos que o desenvolvimento da pílula anticoncepcional tem relação direta não só com o movimento feminista e a luta pelos direitos reprodutivos das mulheres, mas também com o controle da pobreza e da ordem social. Um fio de história que, como vimos, começa com a caça às bruxas.
Cristiana de Barcellos Passinato
Parabéns pelo artigo, Rodrigo e CH!!!
Esse tema é mais que importante e o olhar que o profº Rodrigo trouxe para a pesquisa é mais que necessário.
Muito bom!
Um abraço
Rita de Cássia Oliveira Gomes
não só os saberes anticoncepcionais, como os saberes tradicionais não formais em contraste com os saberes formais reconhecidos pela religião católica.
Lígia Valente
Excelente!